segunda-feira, 25 de março de 2013

Poderá a Economia dizer alguma coisa sobre o comportamento humano?

Eu gosto muito de ler os comentários
porque me informam como as mensagens estão a ser interpretadas pelo leitores. Em particular, houve uma dúvida muito interessante (colocada pelo Vegaspar) e que persiste desde que foram criadas as ciências da natureza. Mas é uma "pergunta de algibeira" porque não pode ser respondida pela própria Ciência. Prova de que esta pergunta é apenas destrutiva é o facto de o meu colega e arqui-inimigo Pimenta  a ter colocado nas minhas Provas de Agregação.
E também gosto de ver as fotografias dos meus seguidores. Mas o que me causa mais alegria é ir a um sitio qualquer e pessoas com quem nunca tive contacto físico virem falar comigo porque me conhecem do blog.  
Fig. 1 - Agradeço a todos os meus seguidores e leitores

A pergunta epistemológica.
Será que o comportamento humano, mesmo sendo o resultado de múltiplas contingências, tem Leis da Natureza que possam ser compreendidas pela humanidade?
Se a resposta for negativa então, não haverá lugar para a Economia enquanto ciência que estuda as decisões dos seres humanos quanto à afectação dos recursos escassos e termos que confiar no vazio.

O Vegaspar acha que a resposta é negativa.
Como "as pessoas ... são muitos menos previsíveis do que as máquinas" então, a Economia não pode conter conhecimento sobre o comportamento humano quanto à afectação dos recursos escassos.
De facto, o Vegaspar tem dúvidas que a resposta seja negativa porque utiliza "muito menos previsível" e não "totalmente imprevisível".

A questão epistemológica da existência da Ciência.
A Ciência existe porque são assumidos axiomas que apenas podem ser discutidos pela filosofia e pela religião. 
     A1 -  a Natureza existe.
     A2 -  a Natureza tem Leis.
     A3 - a Humanidade pertence à Natureza. 
     A4 - a inteligência humana é capaz de compreender as leis da Natureza.
A Ciência não pode questionar estas questões porque a sua não verificação faria com que a Ciência deixasse de existir e, não existindo, a sua conclusão de que as condições não se verificam ficaria sem efeito.

Seria como cada um de nós tentar julgar se existe.
S. Tomás de Aquino pensou ter provado a sua existência com "Peco, logo existo" e Descartes com "Penso, logo existo" mas estavam errados pois isto é uma tautologia que parte do pressuposto de que só o que existe é que peca (STA) e que pensa (D).
Mas vamos supor que eu não existo. Então, como penso, fica provado que o que não existe também pensa.
Então, pensar (ou pecar) não é prova suficiente da minha existência.
Claro que o estimado leitor vai dizer que a minha conclusão (não existo e, no entanto, penso) não faz qualquer sentido lógico, mas a lógica parte de premissas e nunca pode a conclusão lógica dizer que as premissas estão erradas.
Fica então claro que nós não podemos, com ciência, provar que existimos.

A previsibilidade da Natureza, a compreensão humana e o conhecimento.
Se a Natureza não tivesse leis, seria totalmente imprevisível.
Se a nossa inteligência fosse incapaz, a Natureza seria previsível mas nós não a conseguiríamos compreender.
Então, a nossa falta de conhecimento resulta de somar a imprevisibilidade da Natureza com a nossa incapacidade. Como não é possível separar estas duas parcelas, a Ciência assume que a Natureza é perfeitamente previsível e que toda a falta de conhecimento resulta da nossa pouca inteligência.
  
Fig. 3 - Primeira Lei da Natureza: quem pousar aqui a mãozinha, leva estalo.

A Estatística.
Mesmo assumindo que a Natureza tem leis perfeitas, a limitação da inteligência humana implica que o grau de detalhe do conhecimento será sempre limitado.
Havendo Leis da Natureza, até que detalhe poderá ir o conhecimento destas leis?
A humanidade desenvolveu a Estatística para compreender, em termos de valores médios, as Leis da Natureza mais complexas.
  
Temos que distinguir o comportamento do individuo do comportamento das grandezas agregadas.
Uma coisa é eu prever se o meu vizinho se vai suicidar nos próximos 12 meses e outra coisa é eu prever quantas pessoas, entre as 10.6 milhões, se vão suicidar em Portugal nos próximos 12 meses.
Apesar de a decisão individual ser altamente difícil de prever, se compararmos as pessoas que se suicidaram em 2003 com as que se suicidaram em 2006, apesar de não terem sido as mesmas pessoas (é evidente) e as tomadas de decisão terem sido completamente diferentes, existem regularidade à escala agregada.
Por mais incrível que pareça, em ambos os anos a taxa de suicídio é crescente com a idade, cerca de 4%/ano (ver, Fig. 2).
Apesar de eu não fazer a mais pequena ideia de qual será a propensão do meu vizinho para se suicidar, eu sei que, em média, a probabilidade de ele se suicidar aumentará com o envelhecimento, cerca de 4% por cada ano.

Fig. 4 - Suicídios em Portugal por cada 100000 homens (Dados: NES)
   
Vamos ver o que acham desta pergunta.
Existem duas padarias a menos de 50 m de minha casa.
Vamos supor que cada padaria vende 5000 pães por dia a 0.10€/pão e que o custo de produção é de 0.08€/pão. Conclui-se facilmente que o lucro de cada padaria é de 100€/dia.
Vamos agora supor que, como estamos a lidar com pessoas, se for como diz o Vegaspar, o seu comportamento é totalmente imprevisível.
Então, se uma das padarias aumentar o preço para 1.00€/pão, será totalmente imprevisível o que as pessoas vão fazer. Se calhar, ainda vai vender mais pães vindo o seu lucro exponencialmente maior.

Alguém acredita nisto?
Apesar de os estimados leitores serem seres humanos imprevisíveis, prevejo com confiança que não acreditam que  padaria que fixar o preço para 1.00€/pão vá vender mais. Acreditam, penso eu, que essa padaria vai ficar sem clientes e a outra vai ficar com os clientes todos.
Mas não estamos a tratar com pessoas que são, em termos individuais, imprevisíveis?
Estamos e por isso é que não posso garantir que não haja uma única pessoa que não compre um pão por 1.00€ mas a maioria não vai comprar.

Vejamos como funciona a Estatística.
Vou comparar o comportamento humano a um jogo de sorte e azar.
Uma pessoa atira um dado de que pode resultar o número 1, 2, 3, 4, 5 ou 6.
Depois, tira esse número de cartas de um baralho com reposição e soma os pontos (as figuras valem 10 pontos).
A pessoa escreve num papel os pontos que obteve. 

Olhando para uma pessoa.
O conhecimento que eu tenho sobre o número que a pessoa tem escrito no papel é muito pequeno. Sei que será um número qualquer entre 1 e 60 e posso determinar a função distribuição.
Se fosse pedido que avançasse um intervalo com uma amplitude de 2 como previsão, a probabilidade de errar seria muito grande (a melhor previsão seria entre 22 e 24).
(A probabilidade de eu errar seria de 93%).

Vou agora pegar em 100 pessoas e calcular a média.
Agora, em vez de uma pessoa, tenho a média de 100 pessoas.
Eu ainda não sei em concreto quanto vai dar a média mas, se eu repetir várias a experiência, em 95% das vezes, a média dos pontos das cartas vai estar entre 19.29 e 26.53.
A probabilidade de eu acertar a minha previsão (cair no intervalo ]22; 24])  ainda é pequena, 40%.

Vou agora calcular a média de 10000 pessoas.
Em média, em 95% das vezes, soma dos pontos das cartas vai estar entre 22.52 e 23.25.
Agora, a probabilidade de acertar (cair no intervalo ]22; 24]) na minha previsão já é de 99.9999%.

E estamos a falar de sorte e azar.
Mesmo que o comportamento humano fosse totalmente aleatório (como o exemplo do lançamento do dado e o sorteio das cartas do baralho) e, por tanto, com pouca capacidade de eu prever uma valor para a variável que estou a estudar, havendo regularidade estatística (cada pessoa extrai as suas cartas do mesmo baralho) então, eu sou capaz de prever o comportamento médio das pessoas.
Sou capaz de prever como as pessoas vão reagir ao aumento do preço (a quantidade de pães vendidos vai diminuir).

Estimado Vegaspar, penso que agora vai acabar de ler o poste.
Quando estamos incapazes de destruir a argumentação lógica dos nossos adversários, uma escapatória que está entranhada nos nossos genes é utilizar a resposta religiosa do "não acredito".
Recordo que o conhecimento religioso se baseia apenas na crença.
Antigamente, se alguém dizia, Deus escreveu nas Pedras da Lei que não se pode cobiçar a mulher alheia, nós podíamos dizer, com propriedade, Não acredito. Mas naquele tempo não existia conhecimento científico.
Mas o conhecimento científico baseia-se na prova. Agora, quando alguém nos prova que estamos errados, temos que contra argumentar ou aprender.

No outro dia estive a aturar um aluno muito chato.
Dizia que ia ser como o pai (na parte em que é um empresário de sucesso) mas que, ao mesmo tempo, nunca seria como o pai (que se levanta às 5 da manhã para ir trabalhar e só volta às 23h horas do trabalho).
É o tal sonha das mulher magrinhas com mamas grandes.
O que interessa é que, mesmo tendo fraca média e já andar há 5 anos para fazer um curso de 3, queria ir para uma escola de topo mundial porque assim se tornaria num profissional muito mais capaz. O pai paga o que for.
O que lhe disse foi apenas que não existe nenhum estudo que garanta que quem frequenta uma escola de elite se vai tornar um profissional de elite. O que dizem os estudos (estatísticos) é que essas escolas apenas fazem selecção dos mais capazes.
Controlando a capacidade intelectual, por exemplo, com um teste de QI, não existem diferenças significativas entre as melhores escolas do mundo e as escolas médias.
A Ciência é assim: não basta afirmar ou contra-dizer mas é preciso provar com evidencia empírica e dedução matemática. Acabou o lugar da crença.
Fig. 5 - Tive que escolher e preferi ser magra.

É a estatística.
Não quer dizer que não haja uma pessoa que não fique melhor profissional por frequentar uma escola de elite, mas também haverá outra que ficaria melhores profissional se não a tivesse frequentado.

Garanto que, se os salários descerem, o desemprego diminui.
Não garanto que o Sr. Alberto ou a Dona Micas vá arranjar emprego mas, em termos médios, muito mais desempregados encontrarão emprego e muito menos trabalhadores perderão o seu actual emprego.
Garanto que, se o nivel médio de salário descer 15%, a taxa de desemprego vai descer para próximo dos 10%-
E garanto que isso não terá qualquer efeito na procura interna e que será uma política expansionista (por haver mais pessoas a trabalhar).
Pedro Cosme Costa Vieira.

quarta-feira, 20 de março de 2013

O risco do frio extremo e da altitude

Por estarmos no último dia do Inverno, apetece-me falar do frio.
O corpo humano é muito flexível na sua capacidade de sobrevivência a diferentes condições climatéricas. No entanto, existem situações ambientais extremas para as quais não estamos adaptados. Uma dessas situações é o frio que se verifica no Inverno dos países do norte da Europa e da América (desde a Rússia, ao Canadá) e em locais de altura elevada. Um nosso exemplo de exposição acidental a um ambiente com frio extremo foi o caso do nosso montanhista João Garcia na escalada do Evereste (em 1999).
Quando uma pessoa se encontra num ambiente com temperaturas inferiores a -25ºC precisa de um socorro rápido que, por causa das condições metereológicas adversas e a dificuldade de localização das vítimas, pode ser impossível em tempo útil.
Neste poste vou apresentar a física do calor e propor uma abrigo de emergência de baixo custo que deverá ser colocado (no Verão) em locais que no Inverno possam servir de protecção a pessoas perdidas.
Os percursos pedonais de montanha (Serra da Estrela ou da Ilha da Madeira) são locais que melhorariam a sua segurança se utilizassem abrigos deste tipo.
Nos países muito frios em que as pessoas não conseguem pagar aquecimento, este tipo de abrigo também pode ser usado dentro de casa como local de pernoita (como integrante da cama).


Fig. 1 - Os dias de praia já vêm a caminho.

Vamos agora ao frio extremo.
No Inverno dos Países do Norte (desde a Rússia, ao Canadá) e na alta montanha, shit happens. Actualmente as pessoas desvalorizam as condições metereológicas extremas porque, vivendo em cidade, estão rodeadas por abrigos seguros e habituadas ao socorro chegar rapidamente a qualquer local. Mas quando querem testar a sua capacidade em situações incomuns (por exemplo, o montanhismo), o conforto dos carros e os aparentemente acessos fáceis dão uma falsa sensação de segurança porque, em caso de emergência climatológica, o carro deixa de funcionar e as vias de comunicação ficam rapidamente intransitáveis.

Só as pessoas que sabem nadar é que morrem afogadas.
Dizia repetidamente a minha mãe quando íamos dar um mergulho no Mar.
É o excesso de confiança que coloca as pessoas em situações perigosas.

Vamos á física do calor.
O calor é a agitação das moléculas e mede-se em graus centígrados, ºc (entre outras unidades).
Para aumentar a temperatura de uma substancia é preciso fornecer-lhe energia (joules por kilograma por ºc) .

O calor propaga-se por condução. Como a  agitação das moléculas se transmite de umas para as outras, o calor propaga-se ao longo dos materiais por condução.
Existem materiais em que o calor se propaga mais rapidamente (os metais) e outros em que se propaga muito lentamente (os gases).
A propagação do calor é uma perda de energia medindo-se em unidades de potência (joules por segundo que se denominam por watts).
Em termos relativos, a condução de calor através um material mede-se em watts por m2 de exposição numa parede com 1 metro de espessura por grau centígrado de temperatura.

Vamos a exemplos.
      Prata            ->                426 w/m/ºk (é o melhor condutor térmico conhecido)
      Ferro            ->                 80 w/m/ºk
      Granito        ->                   3 w/m/ºk
     Neve compacto   ->          0.7 w/m/ºk
      Tijolo           ->                   0.6 w/m/ºk
      Madeira de Pinho ->           0.12 w/m/ºk
     Neve fofa     ->                  0.15 w/m/ºk
      Lã                ->                   0.04 w/m/ºk
      Ar                ->                   0.026 w/m/ºk
      Espuma de Poliuretano ->   0.022 w/m/ºk
      Vácuo a 95%    ->              0.001 w/m/ºk

Uma parede em granito com 70cm de espessura perde tanto calor (4,3w/m2/ºk) como uma tábuas de madeira de pinho com 2.8cm de espessura ou um pano de lã com 1cm de espessura (porque têm ar aprisionado no seu interior).
Fica desfeito o mito de que uma parede grossa de granito faz casas confortáveis.

E se eu tiver uma sanduiche?
Por exemplo, 9.2 cm poliuretano ensadwichado em chapas de 0.4 cm de aço.
    Aço -> 80 x 100 / 0.4                  = 200000 w/m2/ºk
    Poliuretano -> 0.022 x 100 / 9.2 = 0.239 w/m2/ºk
    Aço ->                                        = 200000 w/m2/ºk

Agora calculamos o inverso (resistência térmica) e somamos resultando:
Resistência térmica da sande -> 4,182
Condutividade térmica da sande é o inverso da resistência -> 0.239 w/m2/ºk.

Em termos práticos, nesta sande, a chapa de ferro é um condutor perfeito do calor.

E uma divisória japonesa de papel de arroz?
Uma divisória com três folhas de papel de arroz (espessura de 0.07mm) separadas por dois espaços com 1 cm de ar é 3x melhor isolante térmico que uma parece de granito com 70cm de espessura.
Extraordinário.

 O calor também se propaga por convecção.
A água é má condutora térmica mas, como a água quente é menos densa que a fria, a circulação da água faz os corpos perderem calor (por convecção). Por esta razão é que quando está vento, o frio fica mais penetrante (entra pela roupa, arrefece-nos o corpo e vai-se embora).
O calor também se perde por irradiação de infravermelhos e por evaporação.

Vamos ao corpo humano.
Nós somos reactores químicos e as reacções que nos permitem estar vivos apenas funcionam a temperaturas próximas de 37ºc.
Ao vivermos produzimos calor.
Quando estamos em repouso, produzimos 80w (1650 kcal/dia). Nesta situação, para o nosso interior estar a 37ºc, a nossa pele deve estar a 33ºc e o ambiente a 28ºc.
Mas quando estamos em actividade produzimos mais calor.

     A ler este blog                   -> 120w,
     Caminhar 5km/h                -> 300w,
     Correr 10km/h                   -> 800w, dez vezes o valor de repouso
     Correr 1 km em 3 minutos -> 1600w.

Uma pessoa com muito boa preparação física é capaz de produzir 800w de calor durante mais de 6 horas seguidas (tremer violentamente de frio). Foi esta capacidade que salvou o João Garcia e a sua falta que levou o seu colega Pascal Debrouwer à morte.

Um abrigo para 2/3 pessoas em ambiente com -30ºc.
O que eu vou apresentar é uma solução de engenharia para um abrigo com capacidade para 2/3 pessoas confortável num meio ambiente com temperatura na ordem dos -30ºC.
O calor que o nosso organismo produz vai ser perdido pela respiração (evaporação de água e aquecimento do ar) e para o ambiente (por condução).
Vou fazer a minha simulação para uma potencia de 120w por pessoa, sendo os valores proporcionais para outros níveis de potencia.

1 - O aquecimento do ar inspirado.
Por cada 1000 j de calor produzido, uma pessoa inspira cerca de 1.2 litro de ar com 21% de oxigénio que expira com cerca de 14% de oxigénio. A potência de 120w precisa de 9.0 litros/minuto, 18 inspirações de 0.5 litros por minuto.
São necessários 12w para aquecer 9 l/m de ar desde -30ºC até 37ºC.

2 - A água que evaporamos nos pulmões.
O ar frio contém pouco vapor de água pelo que o frio desidrata. A uma temperatura ambiente de -30ºC, desidratamos pela respiração cerca de 24 g/h. Evaporar água a 37ºC sem beber implica uma perda 2250 j/g. Então, a desidratação implica uma perda de 18w.

3 - A hidratação
Uma solução que permita a sobrevivência durante vários dias obriga a desviar parte do calor a aquecer gelo para poder ser bebido.
Para nos hidratarmos temos que beber cerca de 1.5l/dia mais a água que evaporamos nos pulmões. então, precisamos derreter 2.0kg de gelo a -30ºC e elevar a sua temperatura até 37ºC que utiliza 12w.

Dos 120w de calor produzido, gastamos 42w na respiração e na água para beber.
Se imaginarmos que o processo tem alguma margem de perda então, já estão gastos 50w, cerca de 40% do calor produzido.

4 - O arrefecimento do corpo.
Temos agora 70w para perder pelas paredes do abrigo.
Se houver 2 pessoas no abrigo, para termos um temperatura na ordem dos 18ºc, o calor perdido pelas paredes do abrigo não podem ser superiores a 3w/ºc.
Utilizar a sandwich de chapa metálica + poliuretano calculado acima como tendo uma perda de calor de 0.239 w/m2/ºk, é possível o desenho da Fig. 2 onde projecto uma pequena janela em vidro duplo.

Fig. 2 - Um projecto de um abrigo para um ambiente com temperatura de -30ºc

E qual a lotação do abrigo?
Se tiver uma pessoa, a temperatura será de -7ºc o que é suportável com roupa de inverno e um saco cama de inverno.
A dimensão é perfeita para 2 pessoas deitadas podendo ter uma terceira pessoas deitada ao contrário. No caso de 3 pessoas, mesmo descendo o nível de actividade até aos 80w (dormir), a temperatura interior ficará nos 18ºc.
Em caso de grande necessidade, o abrigo suporta até 10 pessoas sentadas.

A ventilação.
Assumi que as pessoas usam uma mascara de forma a que o ar expirado seja despejado directamente para o exterior.

Fig. 3 - Esquema da válvula de exaustão do ar expirado

No caso de haver mais de 3 pessoas no abrigo, será preciso ventilação adicional para diminuir a temperatura interna.
No caso da alta montanha, como é preciso beber muita água, para os montanhistas ficarem confortáveis terá que haver 3 pessoas no abrigo.

E quanto custará isto?
Fica barato.
São 25m2 de chapa zincada de 0.4mm que custa cerca de 125€ (um peso de 90kg).
O poliuretano andará em mais 125€.
Depois fica a porta com janela, o sistema de ventilação e a mão de obra.
Deve ficar abaixo dos 750€ por unidade.
Também não poderia ficar muito mais caro pois é muito parecido com uma arca frigorífico grande (com 3000 litros) sem motor.

O peso total deve ficar nos 150kg.

Será possível ir e vir ao Pólo Norte a pé?
Com o conhecimento que existe actualmente sobre a perda de calor, podemos vestir roupa leve e barata que nos permite sobreviver nas condições climatéricas mais extremas.
O segredo da roupa eficiente é aprisionar o ar o que é conseguido alternando uma camada de uma fibra pouco densa com um película fina impermeável ao ar (corta vento).
Não vale a pena vestir roupa muito grossa se o vento puder penetrar e arrastar o calor para fora.
Uma camisola simples tem uma espessura de 0.4cm e uma em fibra cardada tem 2cm.
Se intercalarmos 3 camadas de fibra com 2cm de espessura com 3 películas de plástico, consegue-se reduzir as perdas de calor (nos 2.5m2 de área que temos) a 2.0w/ºk.
Este isolamento é compatível com uma marcha num ambiente com temperatura na ordem de -30ºc. Interessante bastarem 6cm de espessura de roupa devidamente organizada para resistir a -30ºc.
Para dormir será necessário reforçar o isolamento com um abrigo de neve.


Fig. 4 - Lá para o Norte também se encontram mulheres bonitas

E a comida?
Ir ao Polo Norte e voltar a pé demora cerca de 90 dias.
Se a potencia térmica média for de 240w, serão precisas 5000kcal/dia.
A gordura (azeite, banha de porco, manteiga) tem 9000kcal/kg. Então, nos 90 dias serão precisos 50kg de gordura mais 20 kg de alimentos diversos. A segurança aponta para que, inicialmente, o explorador tem que transportar um mínimo de 100kg de alimentos.
É muita carga para um homem só a pé (com um trenó) mas não é impossível se, com a ajuda do GPS, a carga foi sendo deixada ao longo do caminho (para o regresso).
Numa espedição com meia dúzia de pessoas para diminuir o risco (em caso de acidente ou doença, o socorro é virtualmente impossível), é uma missão realizável e, provavelmente, menos arriscada, mais barata e mais emocionante que subir o monte Evereste.

Pedro Cosme Costa Vieira

sexta-feira, 15 de março de 2013

A sistema de eleição papal e o marasmo

Sempre que se inicia a eleição de um novo Papa, olhando para o sistema de eleição (votação repetida sem exclusão de ninguém até um ter 2/3 dos votos), parece que vamos ter que esperar dezenas de anos até a montanha parir alguma coisa.
Mas, decorridas apenas 4 ou 5 voltas, habemus papa
Porque será que, de um sistema que parece totalmente incapaz, resulta rapidamente uma eleição?
Fig 1 - Habemus papa há muitos anos

Poderá a eleição do Papa demorar para sempre?
Em linguagem científica a questão é
Terá o procedimento de eleição papal uma solução não trivial em tempo finito?

A governação da Igreja é uma oligarquia.
O papa classifica-se a si próprio como monarca porque o seu poder vem directamente de Deus (segundo ele). Como o papa não tem filhos, fica o problema de Deus, repetidamente, ter que escolher um novo papa que é ultrapassado pelo voto dos cardeais (os "príncipes da igreja").
De facto, o regime de governação da Igreja é uma oligarquia onde cada papa é eleito pelos cardeais nomeados pelos antecessores aos quais vai acrescentado novos cardeais eleitores até ao limite de 120 (cerca de 1 por cada 10 milhões de fieis).
Esta oligarquia é republicana porque qualquer homem (independentemente da posição dos seus familiares) pode ser eleito papa, é piramidal e não é representativa (os do patamar inferior não influenciam significativamente a escolha dos do patamar superior).


Fig. 2 - O poder da Igreja é uma oligarquia piramidal com 1 eleitor por cada 10 milhões de fieis.

Mas vamos ao que interessa.
C1) Qualquer homem solteiro pode ser eleito Papa mas, por norma, os elegíveis são os cardeais eleitores.
C2) Apesar de número de eleitores ser uma decisão do papa, desde 1973 que está voluntariamente limitado a um máximo de 120 (actualmente, são 115).
C3) O papa tem que ser eleito com mais de 2/3 dos votos dos cardeais (actualmente, 77).
C4) A eleição tem um número indeterminado de voltas porque nunca são eliminados os menos votados.
Assim, aparentemente, do processo eleitoral pode nunca resultar numa escolha.
Se, por exemplo, em cada volta se eliminasse o cardeal menos votado (e, no caso de empate, o mais velho), ao fim de 113 votações, já só haveria 2 nomes. Mas, mesmo assim, a situação poderia não ter fim se nenhum dos dois tivesse 2/3 dos votos. Por exemplo, os votos dividiam-se entre o cardeal que defendia o celibato obrigatório e o cardeal que defendia o seu fim.

Mas existe uma condição que torna o processo eleitoral ter solução não trivial em tempo finito.
C5) É que apenas o papa pode nomear novos cardeais.
Então, com o tempo, os cardeais vão atingindo o limite de idade (ou morrendo), diminuindo o número de votantes.
Se o processo de eleição tivesse decorrido durante 10 anos, em 2023 o colégio de cardeais já só teria 50 cardeais com menos de 80 anos, sendo precisos apenas 34 votos para eleger o novo papa.

Este sistema nunca seria implementável numa democracia.
Porque há um número muito grande de eleitores (excepto se o país fosse muito pequeno) e estão sempre a entrar novos eleitores (porque nas democracias a condição de eleitor resulta apenas da idade).

Agora que temos novo Papa, business as usual.
O problema das oligarquias é que não existe alternância de poder.
Apesar de o senso comum achar que a alternância entre PS e PSD é a raiz de todos os nossos problemas, agora imaginem que tínhamos lá o Sócrates para sempre.
As pessoas nunca mudam o seu pensamento apenas havendo progresso nas ideias com pessoas novas, não apadrinhadas pelas antigas.

Quem está no poder apenas escolhe aqueles que pensam como ele pelo que o novo Papa é sempre uma pessoa que pensa como o Papa antecessor.
Naturalmente, o novo Papa veio logo dizer que tudo vai continuar como é há centenas de anos.
     A) Casamento dos padres? Nem pensar.
     B) Ordenação das mulheres? O sítio delas é em casa a criar os filhos.
     C) Os paneleiros e lésbicas mesmo castos? São uma aberração da Natureza.
     E) O divórcio? É uma coisa do Demónio.

Onde diz na Bíblia o que a oligarquia da Igreja defende?
Em lado nenhum e mesmo que dissesse, também lá refere que o povo eleito é o povo de Israel que descende dos 70 da tribo de Jacó!
É claro que todos nós, portugueses, descendemos de alguém da tribo de Jacó mas a maior parte dos católicos por esse mundo fora não descende.

A eleição resulta rápida porque as cartas estão marcadas.
Dentro do colégio eleitoral não há discussão de ideias (manifestos eleitorais) porque todos os cardeais pensam exactamente aquilo que pensava quem os meteu lá.
Estou persuadido que se fizessem uma sondagem aos católicos, uma grande maioria responderia ser  a favor do fim do celibato obrigatório dos padres. Foi muito pior a despenalização do aborto ou o casamento gay e a maioria do povo já acha aceitável.
Mesmos se perguntassem aos padres, ainda se observava uma maioria a fim do celibato mas os cardeais não são representativos das vontades dos católicos.
Mas os cardeais são clones da mesma ideia pelo que, naturalmente, chegam a acordo muito rapidamente.

Quem tem esperança que algo, alguma vez, mude nas ideias papais, que espere sentado.


Fig. 3 - Ao mostrar-te as mamas da minha irmã, estou-te a mostrar as minhas mamas.

Pedro Cosme Costa Vieira

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