O que eu quero transmitir neste poste é complicado pelo que, mesmo esforçando-me bastante e durante vários dias, saiu um texto um "bocadinho" aborrecido de ler. No entanto, peço um pouco de paciência e concentração porque penso que é um texto importante importante para as pessoas que pretendam ficar a compreender a problemática dos preços, porque o preço da água poderia ser menor e como se justifica que certos produtos sejam subsidiados pelo Estado!!!!! que haja descontos e porque o pica deve deixar que os jovens amalucados viagem nos transportes públicos sem bilhete!!!!
A determinação do preço das coisas é um assunto central na Economia de Mercado (a que os esquerdistas chamam Capitalismo) e na gestão das empresas (pois condiciona o lucro).
Nas últimas semanas surgiu por aqui uma discussão sobre preços.
Será que o preço da água é alto ou é baixo?
Será que o preço do Tesla tem baterias para andar ou vai ficar sem gás?
Tal com as dores de costas que atacam as pessoas, também todos nós nos perguntamos volta e meia "porquê este preço?".
Os produtores são, de facto, transformadores.
Da mesma forma que o cozinheiro transforma arroz, batatas, couves, cebolas, enchidos e carnes de vaca, porco e frango em cozido à portuguesa, um produtor transforma os inputs (trabalho, capital, bens intermédios, matérias primas e conhecimento) num output (um novo bem).
Uma economia é feita por milhares de produtores interligados por produtos intermédios, capital e conhecimento sendo que cada ligação tem uma quantidade e um preço.
O objectivo da economia.
Muitas vezes vejo escrito que o objectivo da economia é satisfazer as necessidades insaciáveis das pessoas mas isso é o objectivo da engenharia! O que a economia faz é compreender como, enquanto fenómeno social, os produtores se coordenam com os consumidores e tentar desenhar formas de melhorar este processo de coordenação (
i.e., melhorar o funcionamento do mercado).
A economia não produz nada, esse trabalho é o da engenharia.
Intermédio entre a engenharia e a economia está a gestão que optimiza processos (como a engenharia) mas que também aproveita o conhecimento sobre o comportamento dos consumidores e dos mercados (como a economia) para aumentar o lucro da empresa.
O que vai fazer o produtor.
A decisão do produtor é tomada em duas fases.
Na primeira fase, o produtor decide o nível do investimento (e a escala do processo produtivo) que, uma vez feito, é um custo afundado,
i.e., não tem influência na decisão da segunda fase.
Na segunda fase, tomando a escala como um dado, o produtor decide o nível de produção e o preço a afixar no dia a dia.
Primeira fase = Investimento.
A escala vai ser decidida com base no que o produtor pensa vir a ser a quantidade que o mercado pode adquirir durante o período de amortização do investimento, por exemplo, 25 anos, e o seu preço. Assim, é uma análise especulativa (porque baseia-se em informação que vem do futuro).
Para ilustrar esta decisão, vou imaginar uma rede de abastecimento de água potável.
População média servida: 250000 pessoas;
Consumo médio por pessoa ao preço de 0,80€/m3: 250 litros/dia/pessoa;
Consumo médio diário: 250000*250 /1000 = 37500 m3/dia.
Facturação diária: 37500*0,80 = 30000€/dia.
Economias de escala, custo médio e custo marginal.
Duplicar a escala implica um aumento no investimento mas de forma menos que proporcional.
Vamos imaginar que uma escala de 37500 m3/dia implica um investimento de 50 milhões € e quadruplicar essa escala para 150000 m3/dia faz duplicar o investimento para 100 milhões €.
Amortizar um investimento de 50 milhões € em 25 anos com uma taxa de juro de 5%/ano traduz um custo médio do investimento de 9485 €/dia. Duplicar a escala para 75000 m3/dia faz aumentar o investimento mas faz diminuir o custo fixo de 0,253€/m3 para 0,178€/m3.
O custo marginal é o custo das "ultimas" unidades produzidas. Assim, produzir os primeiros 37500 m3/dia tem um custo fixo médio de 0,253€/m3, os segundos 37500 m3/dia tem um custo de 0,105€/m3 e os terceiros 37500 m3/dia tem um custo de 0,080€/m3, 1/3 do custo dos primeiros 37500 m3/dia.
Escala adoptada.
Apesar de a previsão apontar para um consumo de 37500 m3/dia, como pode haver erros de previsão, variabilidade em torno da média (de dia e no verão o consumo é maior) e perdas da rede, e porque existem economias de escala no investimento, o produtor vai adoptar uma escala de 100000 m3/dia que precisará de um investimento de 81,6 milhões € que, nas condições consideradas, implicam nos próximos 25 anos um custo fixo de 15500€/dia.
Custo fixo traduz que o produtor tem que o pagar independentemente da quantidade que produzir.
Segunda fase = o dia a dia.
Além do custo fixo, haverá um custo variável que, normalmente, é crescente a taxa crescente com a produção (duplicar a produção mais que duplica os custos).
Vamos imaginar que duplicar o nível de produção vai aumentar os custos totais em 110%. Esta estrutura de custos pode ser condensada numa função isoelástica:
Custo variável (Q) = 0,086*Q^1,1
Agora, o produtor já tem a função custo total (em €/dia):
Custo(Q) = 15500 + 0,086*Q^1,1
O preço e o custo médio.
O investimento é uma fase muito delicada porque, se antes de ser feito, a facturação prevista (dada pelo produto do preço pela quantidade vendida) tem que ser capaz de cobrir os custos fixos (a amortização do investimento) mais os custos variáveis, depois de feito o investimento (que é um custo afundado), o produtor passa a poder controlar apenas os custos variáveis.
Assim, se as conjecturas feitas sobre o futuro, a especulação, se revelarem erradas, o investimento pode-se tornar ruinoso (que é o que está a acontecer nos CTT).
Vamos imaginar que, em fase de projecto, o produtor vai fixar um preço de 0,80€/m3.
Neste preço, o produtor está a pensar que vai vender 37500 m3/dia facturando 30000€/dia para cobrir custos totais de 24850€/dia (uma margem de lucro de 21%).
Agora, vem o lado dos consumidores.
Vamos supor que, no futuro, se concretiza mesmo que, ao preço de 0,80€/m3, o produtor consegue vender exactamente 37500 m3/dia.
Acontece que uma das leis da natureza da economia é que, se o preço for menor, os consumidores vão adquirir maior quantidade.
Esta lei da natureza resulta de:
1) as pessoas substituem os bens mais caros pelos bens mais baratos,
2) o bem-estar que as pessoas retiram de uma unidade de um bem é decrescente com a quantidade previamente consumida e
3) as pessoas de menores recursos passam a poder "entrar no mercado".
Vamos supor que, as pessoas no seu conjunto adquirem a quantidade:
Qproc(P) = 33540*P^-0,5
Outra lei da natureza da economia é que, quando uma pessoa adquire um bem, fica melhor (porque apenas compra se atribuir ao bem um valor superior ao preço de aquisição).
Será que o produtor deveria fazer descontos?
Com o modelo de custos considerado, apesar de ter capacidade excedentária, o produtor não tem incentivos a aumentar o nível de produção porque, para isso, teria que diminuir o preço a todos os consumidores o que reduziria o seu lucro. Isto acontece porque o produtor é monopolista e não existem alternativas à água (a quantidade adquirida pelos consumidores varia relativamente pouco com a diminuição do preço).
Sendo um monopólio, existe um regulador que vai olhar para os custos totais e vai obrigar o produtor a afixar um preço máximo que cubra esses custos com uma margem, no caso, seria de 0,80€/m3.
Mas a questão é saber se o produtor poderá aumentar o seu lucro fazendo descontos.
Produzir os 37500 m3/dia tem um custo médio total de 0,663€/m3 o que, com a margem de 21%, dá os tais 0,80€/m3. Mas produzir mais 1m3 só vai custar 0,276€/m3 pelo que o produtor terá um aumento do lucro se vender, além do que já vende a 0,80€/m3, esse m3 com um desconto de 50%!
O problema está na "divisão do mercado". Como será possível garantir que a água vendida com desconto não vai fazer diminuir a quantidade de água normalmente vendida a 0,80€/m3?
Escalões decrescentes ou existência de parte fixa.
A decisão das pessoas não tem em atenção a parte fixa do preço mas apenas a parte variável.
Assim, vamos supor que em média as pessoas gastam 10 m3/mês pelo qual pagam 5€/m3. Se o preço diminuir para 1€/m3 e houver dois escalões (ou uma parte fixa), as pessoas passarão a consumir mais e a facturação aumenta.
Vamos supor a introdução de um segundo escalão com desconto de 60%.
Consumo <=10 => 5€/m3
> 10 => 2€/m3
Se o custo marginal de produção for de 1,50€/m3, o produtor aumentará o seu lucro quando a família adquire mais água a 2€/m3.
É aqui que entram os subsídios!
O óptimo seria o preço ser igual à parte variável dos custos e a parte fixa (que resulta do investimento inicial) ser obtida de forma independente da quantidade consumida, por exemplo, como uma parte fixa na factura.
O problema é que pessoas diferentes (rendimento, idade, estado civil, número de filhos, sexo, escolaridade, estado de saúde, etc.) têm condições diferentes para pagar a parte fixa pelo que essa parte deveria ser diferenciada, uns deveriam contribuir com mais e outros com menos.
E o que será justo?
Tem a ver com a função "bem-estar social".
Quando eu era pobre pensava "o dinheiro só é importante para quem não o tem". Na altura imaginava-me chegar à cantina e não ter os 30 escudos que custava uma refeição.
E por isso é que tenho tanta pena da ucraniana!
É que um euro não é igual para todas as pessoas, para um pobre são duas refeições (compra 10 pães secos) ou uma viagem que demora a pé mais de uma hora. Para um rico, um euro não é nada. Por isso, os ricos têm a "obrigação moral" de pagar mais pelos custos fixos.
Digo "obrigação moral" porque o meu pai andou longos anos a estudar para padre e dizia que a moral da igreja era "cada um contribuir conforme puder e receber conforme necessitar"
É este princípio económico que está em Lucas 21:1-4
1 Certo dia, quando Jesus estava de frente às caixas de ofertas, sentado, observando como as várias pessoas depositavam suas doações e a maneira como muitos ricos ofertavam grandes quantias, 2 notou que também estava ali uma viúva, bem pobrezinha, que se aproximou e despejou numa delas duas pequenas moedas que valiam quase nada.
3 Ele, então, assim que viu isso, pediu aos seus discípulos que prestassem bastante atenção ao que iria lhes dizer, e depois comentou:
— Olhem essa pobre mulher! O pouco que ela deu vale mais do que todas as doações que foram feitas aqui. 4 Pois ela, apesar de sua pobreza material, deu tudo o que possuía, enquanto todos os outros deram apenas o que tinham em excesso. Sua oferta foi realmente de alto valor, pois ela ofereceu tudo o que lhe restava para se manter, seu último dinheirinho.
É sempre óptimo haver descontos.
Este é um problema muito importante na gestão.
Como desenhar um desconto que faça aumentar o lucro da empresa?
É óptimo deixar os jovens amalucados dos bairros sociais viajar nos transportes públicos sem bilhete (se não levantarem problemas) pois ir um a mais ou a menos não aumenta os custos e esses jovens, de outra maneira, teriam que ir a pé! Mas para isso é preciso separar os amalucados dos outros, por exemplo, metendo uma grade que é preciso saltar por cima (como há em Paris onde os gestores da rede de transportes não são mais burros do que os nossos gestores), meter um patim na traseira do autocarro (como tinha o eléctrico), coisas que só os amalucados possam utilizar.
Por fim, os subsídios do Estado.
Quando não é possível diferenciar o que é justo cada pessoa contribuir para a parte fixa, o melhor é haver um subsídio por parte do Estado que cubra esse custo!!!!!
Os impostos servem exactamente para isso, para pagar aquilo onde não seja possível aplicar o principio do "utilizador pagador".
Se ir caminhar precisa de um passeio e não é possível cobrar uma portagem aos peões que passam por lá, o melhor é essa obra ser paga com os nossos impostos.
Claro que há muitas coisas que recebem subsídios e que não deveriam receber mas isso é uma discussão velha e sem solução.
Finalmente, e não tendo nada a ver.
Sou contra o Presidente da República ter vetado a proposta de lei dos partidos que tinha o voto favorável de mais de 95% dos deputados. Não é só o presidente que é um cata-vento. Desta vez fiquei a admirar o PCP que não se deixou seduzir pelo populismo, que defendeu com unhas e dentes o que acha certo mesmo que possa não ser popular.
Contrariamente ao que dizem os comentadores sobres as eleições no PSD, os partidos não devem defender as ideias nem escolher os líderes que a maioria gosta mas sim aquilo que os seus "donos" acham mais adequado. Depois, haverá eleições e um partido ganha e os outros perdem (excepto o PCP e, ultimamente, o CDS, que ganham sempre). Nenhum dos candidatos presta mas escolham o que acharem melhor que ninguém tem nada com isso.
Na América os democratas escolheram a Clinton e os republicanos escolheram o Trump.
O Trump dizia o contrário do que a Clinton dizia e a Clinton dizia contrário do que o Trump dizia.
Quem gostava da Clinton não gostava do Trump e quem gostava do Trump não gostava da Clinton.
Depois, vieram as eleições e os eleitores escolheram.
Os populistas querem um candidato desinfectado, que agrade a toda a gente, tenha um discurso tipo Miss "desejo para o próximo ano paz, harmonia e estabilidade", tipo o cata-vento que temos por aqui.
Sou contra o Estado ter recebido 909 milhões de euros na privatização dos CTT e , agora, porque esse capital tem que ser remunerado, lave as mãos dizendo que não é nada com ele. Claro que os CTT têm que dar pelo menos 65 milhões € por ano para pagar o "juro" dos 909 milhões € (em vez de mandar bocas, os esquerdistas deveriam disponibilizar-se para devolver o dinheiro da privatização, corrigido dos dividendos e dos juros).
Desejos de bom ano e só espero que o peru não tenha queimado