Qual será o desemprego no Bangladesh?
Num comentário o ii-v-i-aflat afirma que a taxa de desemprego no Bangladesh é na ordem dos 25% (referido num site), ainda maior que os nossos 16.7%. Assim, aparentemente, um crescimento robusto e um mercado de trabalho flexível não parecem suficientes para acabar com o desemprego.
Contrariamente a essas estatísticas, o Banco Mundial indica taxas de desemprego nos países emergentes na ordem dos 5%. De que lado estará a verdade?
Os mercados de trabalho são muito diferentes.
Quando ouvimos falar de outro país qualquer, pensamos que a realidade de lá é parecida com a nossa. Em particular, pensamos o mercado de trabalho dos países pobres é idêntico ao nosso em que a maior parte do rendimento das família resulta dos empregos por conta de outrem.
Mas estamos enganados.
Nos países desenvolvidos cerca de 85% dos empregos são por conta de outrem enquanto que nos países subdesenvolvidos essa percentagem desce para apenas 20%. Nos países pobres mais de 80% têm auto-emprego (ver, Fig. 1).
Como funciona o mercado de trabalho?
A agricultura começou há cerca de 10000 anos (a revolução do Neolítico) e, ainda hoje, é a base de todas as economia.
Porque a produção agrícola está muito dependente do solo, todos os países têm uma produção agrícola per capita idêntico, cerca de 400€/ano com um desvio padrão de 125€/ano, não tendo qualquer relação com o PIB pc do país (ver, Fig. 2). Isto traduz que, apesar de todos os alimentos nascerem da agricultura, o desenvolvimento económico é um processo de "destruição" dos empregos na agricultura (mas mantendo a produção) e a sua transferencia para a industria e, posteriormente, para os serviços (o êxodo rural).
É demagógico apontar a agricultura como o futuro o motor da nossa economia.
Portugal tem uma produção agrícola per capita anual de 380€ (2.4% do PIB) que compara com a Alemanha 214€ (0.9%), a Espanha 540€ (2.7%), a Índia 368€ (17.9%) e o Bangladesh 192€ (18.9%).
O peso da agricultura nos países com um PIBpc.ppc inferior a 2500€ é cerca de 30% enquanto que nos outros é cerca de 7%.
Como funciona a produtividade.
Para se produzir é preciso, por um lado, capital, K, (máquinas e ferramentas, vias de comunicação, portos, canais de irrigação etc.) e, por outro lado, trabalho, H, (horas de trabalho). O que mistura do trabalho com o capital é a tecnologia, A, cujo nível é (ligeiramente) diferente de país para país.
Além dos factores de produção, o Estado da Natureza, E, também influencia a produção.
O Gasparzinho invocou "o mau tempo" porque a Teoria Económica denomina a parte que não se consegue explicar por "Estado da Natureza".
Como se faltar um dos factores não se pode produzir, modelizar a ligação entre os diversos factores é normal usar uma função multiplicativa sendo a mais utilizada a isoelástica (denominada de Cobb-Douglas):
Y = A x T^0.33 x H^0.67 x E
Contrariamente a essas estatísticas, o Banco Mundial indica taxas de desemprego nos países emergentes na ordem dos 5%. De que lado estará a verdade?
Os mercados de trabalho são muito diferentes.
Quando ouvimos falar de outro país qualquer, pensamos que a realidade de lá é parecida com a nossa. Em particular, pensamos o mercado de trabalho dos países pobres é idêntico ao nosso em que a maior parte do rendimento das família resulta dos empregos por conta de outrem.
Mas estamos enganados.
Nos países desenvolvidos cerca de 85% dos empregos são por conta de outrem enquanto que nos países subdesenvolvidos essa percentagem desce para apenas 20%. Nos países pobres mais de 80% têm auto-emprego (ver, Fig. 1).
Fig. 1 - Percentagem de trabalhadores por conta própria vs PIBpc.ppc, USD (dados: Banco Mundial)
Como funciona o mercado de trabalho?
A agricultura começou há cerca de 10000 anos (a revolução do Neolítico) e, ainda hoje, é a base de todas as economia.
Porque a produção agrícola está muito dependente do solo, todos os países têm uma produção agrícola per capita idêntico, cerca de 400€/ano com um desvio padrão de 125€/ano, não tendo qualquer relação com o PIB pc do país (ver, Fig. 2). Isto traduz que, apesar de todos os alimentos nascerem da agricultura, o desenvolvimento económico é um processo de "destruição" dos empregos na agricultura (mas mantendo a produção) e a sua transferencia para a industria e, posteriormente, para os serviços (o êxodo rural).
Fig. 2 - Relação entre a produção agrícola (em €/ano e em % do PIB) e o PIB pc, ppc, preços de 2005, média 2007-11, 1USD=0.72€ (dados: Banco Mundial)
É demagógico apontar a agricultura como o futuro o motor da nossa economia.
Portugal tem uma produção agrícola per capita anual de 380€ (2.4% do PIB) que compara com a Alemanha 214€ (0.9%), a Espanha 540€ (2.7%), a Índia 368€ (17.9%) e o Bangladesh 192€ (18.9%).
O peso da agricultura nos países com um PIBpc.ppc inferior a 2500€ é cerca de 30% enquanto que nos outros é cerca de 7%.
Como funciona a produtividade.
Para se produzir é preciso, por um lado, capital, K, (máquinas e ferramentas, vias de comunicação, portos, canais de irrigação etc.) e, por outro lado, trabalho, H, (horas de trabalho). O que mistura do trabalho com o capital é a tecnologia, A, cujo nível é (ligeiramente) diferente de país para país.
Além dos factores de produção, o Estado da Natureza, E, também influencia a produção.
O Gasparzinho invocou "o mau tempo" porque a Teoria Económica denomina a parte que não se consegue explicar por "Estado da Natureza".
Como se faltar um dos factores não se pode produzir, modelizar a ligação entre os diversos factores é normal usar uma função multiplicativa sendo a mais utilizada a isoelástica (denominada de Cobb-Douglas):
Y = A x T^0.33 x H^0.67 x E
O auto-emprego.
H1) Vou imaginar uma economia em que existem 1000 unidades de capital, 1000 habitantes que trabalham H horas por semana e que o nível tecnológico é 20.5.
H2) Vou imaginar que todas as pessoas são iguais e que o capital, que também é homogéneo, é dividido equitativamente pelas pessoas, 1 u/pessoa.
H3) Como trabalhar é um sacrifício vou imaginar que a pessoa só trabalha se numa hora produzir pelo menos um certo quantitativo, 2.00€.
H4) A produção é a unidade de valor (o preço dos bens produzidos é 1€/unid).
Uma pessoa trabalhando H horas por semana produzirá
Y = 20.5 x 1^0.33 x H^0.67 x E
A pessoa vai trabalhar enquanto a produção for maior que 2€ o que acontece quando a produtividade marginal for 2.
{H: Y'H = 2€/h} => H = 40h/semana
Havendo 1u de capital por pessoa, a produção será de 242.74€/semana e a produtividade média será cerca de 6.00€/h.
Como a produtividade está dependente não só do trabalho como também do capital podemos dividir a produtividade média em 4.00€/h para o trabalho e 2.00€/h para o capital (e por unidade de capital).
Na economia do "auto-emprego" não existe desemprego.
Quando todas as pessoas trabalham no seu negócio, podem trabalhar mais ou menos horas mas nunca estão sem emprego. Quando há um choque exógeno da natureza (o E altera-se), o rendimento da pessoa ajusta instantaneamente. Por exemplo, se a seca fizer E diminuir de 1 para 0.8, o rendimento do trabalhador com 1u de capital passa de 6.00€/h para 4.80€/h.
Será bom haver politicas macroeconómicas de estabilização?
Vamos supor que os ciclos económicos oscilam entre anos maus (em que E = 0.8) e anos bons (em que E = 1.2) e que a pessoa pretende trabalhar em média 40h/s.
Se houver regularização do rendimento a pessoa vai trabalhar mais nos anos maus. Trabalha 51.7h/s nos anos maus e 28.3h/s nos anos bons o que lhe permite um rendimento constante de 230.75€/s.
Se houver regularização do horário de trabalho a pessoa trabalha 40h/sem o que lhe permite ter um rendimento médio de 242.54€/s (194.19€/s nos anos maus e 291.28€/sem nos anos bons). A pessoa poupa 97.09€ nos anos bons para gastar nos maus.
Se a pessoa adoptar a estratégia óptima (poupando nos anos bons para os maus) vai trabalhar mais nos anos bons. Trabalha 18.1h/sem nos anos maus e 61.9h/sem nos anos bons o que lhe permite um rendimento médio de 252.21€/sem (114.20€/s nos anos maus e 390.22€/sem nos anos bons). A pessoa trabalha mais 21.9h/sem e poupa 276.02€ nos anos bons para gastar e descansar nos maus.
É interessante observar que a oscilação da produtividade permite um rendimento médio superior ao caso em que não acontecem choques da natureza (242.74€/sem)
Podemos ver que a regularização macroeconómica vai diminuir o rendimento médio da pessoa.
Porque é que nos países pobres as pessoas produzem pouco?
Nos países pobres trabalham-se mais horas que nos países ricos pelo que a diferença na produtividade não vem do trabalho.
Fica o capital e o nível tecnológico.
O nível de capital no Bangladesh é de cerca de 450€ por pessoa e 67.5% da população é activa.
O nível de capital em Portugal é de cerca de 30000€ por pessoa e 56.0% da população é activa.
Isto traduz que em Portugal existe 53600€ de capital por posto de trabalho e no Bangladesh apenas existe 667€ por posto de trabalho.
O nível de capital associado a um emprego em Portugal é 80 vezes o nível no Bangladesh. Tal traduz que cada trabalhador português ter 1 unidade de capital enquanto que um bangladesheano ter apenas 0.0125 unidades.
Atendendo à diferença de capital, o bangladesheano produziria apenas 1.43€/h, 23% da nossa produtividade.
E o nível tecnológico no Bangladesh é inferior ao nosso (e.g., por causa da baixa escolaridade) pelo que a produtividade vem ainda mais reduzida (para 6.6% da nossa produtividade).
É por não terem capital.
Não é, como dizem os esquerdistas, por os salários serem baixos nem por o grande capital explorar os desgraçadinhos.
Não é, como dizem os direitistas, por serem malandros, pretos, azuis ou amarelos nem por serem governados por pessoas corruptas.
Não é nada disso.
A produtividade em Portugal é 15 vezes a do Bangladesh porque temos 80 vezes mais capital por trabalhador que o Bangladesh.
No Bangladesh é normal um empresário começar o seu negócio com um microcrédito de 200€ (para comprar um fogão, uma panela e um toldo para arrancar com um restaurante de rua). Em Portugal o mesmo tipo de negócio precisa de 16000€ (uma rulote).
Como se aumenta o capital?
A falta de capital apenas pode ser resolvida (lentamente) com muito trabalho e pouco consumo (pois a poupança interna é o motor do investimento).
Apesar de capital estrangeiro (o investimento directo estrangeiro) poder ser muito positivo por levar não só capital como também difundir tecnologia, a evidência empírica indica que apenas os países que investiram principalmente com base na poupança interna é que conseguiram abandonar a pobreza (por, a prazo, o pagamento de juros, lucros e amortizações ao exterior drenar os recursos gerados).
Além disso, os estrangeiros têm um percepção do risco diferente dos nacionais (cobram juros maiores).
Finalmente as estatísticas do desemprego.
Uma taxa de desemprego de 5% da população activa traduz que o Bangladesh tem 5.0 milhões de desempregados (a população activa é de cerca de 100 milhões de pessoas). A questão é que a população empregada por conta de outrem é menos que 20 milhões de pessoas. Então, retirando da equação as pessoas auto-empregadas, temos 5 milhões de desempregados num universo de 20 milhões de pessoas. Assim medido, o desemprego será de 25% dos empregados por conta de outrem (e não dos activos).
E porque existem estes 5 milhões de desempregados?
Porque o progresso implica (ou é causado) a passagem de trabalhador por conta própria para trabalhadores por conta de outrem. Revendo a Fig. 1, o aumento de 1% do PIB pc implica que 0.25% da população deixa o emprego por conta própria e procura um emprego por conta de outrem.
Estando o Bangladesh a crescer mais de 5%/ano, todos os anos, além das pessoas que vão nascendo (2%/ano), cerca de 1.2 milhões de trabalhadores transita do auto-emprego para o mercado dos empregos por conta de outrem (6%/ano dos empregos existentes).
Naturalmente que custa a digerir a massa de pessoas que entra continuamente no mercado de empregos por conta de outrem.
Concluindo com o exemplo do Brasil.
O primeiro passo do desenvolvimento é a agricultura libertar pessoas que passam para pequenas actividades em auto-emprego.
Depois, as pessoas em auto-emprego começam a entrar no mercado de trabalho por conta de outrem onde os salários (e a produtividade) são maiores.
O processo dinâmico de transição, apesar de ter associadas taxas de crescimento elevadas, não pode ser acompanhado pelo aumento dos salários dos diversos sectores porque o melhorar da qualidade de vida dá-se pela passagem do auto-emprego (com rendimentos muito baixos) para os empregos por conta de outrem (com salários apenas baixos).
Um país, como o Brasil, que tenha uma lei que incorpora no Salário Mínimo o crescimento do PIB está condenado a que o processo de desenvolvimento económico estagne.
Eu tenho atrasada a resposta a alguns comentários.
Pedro Cosme da Costa Vieira
H1) Vou imaginar uma economia em que existem 1000 unidades de capital, 1000 habitantes que trabalham H horas por semana e que o nível tecnológico é 20.5.
H2) Vou imaginar que todas as pessoas são iguais e que o capital, que também é homogéneo, é dividido equitativamente pelas pessoas, 1 u/pessoa.
H3) Como trabalhar é um sacrifício vou imaginar que a pessoa só trabalha se numa hora produzir pelo menos um certo quantitativo, 2.00€.
H4) A produção é a unidade de valor (o preço dos bens produzidos é 1€/unid).
Uma pessoa trabalhando H horas por semana produzirá
Y = 20.5 x 1^0.33 x H^0.67 x E
A pessoa vai trabalhar enquanto a produção for maior que 2€ o que acontece quando a produtividade marginal for 2.
{H: Y'H = 2€/h} => H = 40h/semana
Havendo 1u de capital por pessoa, a produção será de 242.74€/semana e a produtividade média será cerca de 6.00€/h.
Como a produtividade está dependente não só do trabalho como também do capital podemos dividir a produtividade média em 4.00€/h para o trabalho e 2.00€/h para o capital (e por unidade de capital).
Na economia do "auto-emprego" não existe desemprego.
Quando todas as pessoas trabalham no seu negócio, podem trabalhar mais ou menos horas mas nunca estão sem emprego. Quando há um choque exógeno da natureza (o E altera-se), o rendimento da pessoa ajusta instantaneamente. Por exemplo, se a seca fizer E diminuir de 1 para 0.8, o rendimento do trabalhador com 1u de capital passa de 6.00€/h para 4.80€/h.
Será bom haver politicas macroeconómicas de estabilização?
Vamos supor que os ciclos económicos oscilam entre anos maus (em que E = 0.8) e anos bons (em que E = 1.2) e que a pessoa pretende trabalhar em média 40h/s.
Se houver regularização do rendimento a pessoa vai trabalhar mais nos anos maus. Trabalha 51.7h/s nos anos maus e 28.3h/s nos anos bons o que lhe permite um rendimento constante de 230.75€/s.
Se houver regularização do horário de trabalho a pessoa trabalha 40h/sem o que lhe permite ter um rendimento médio de 242.54€/s (194.19€/s nos anos maus e 291.28€/sem nos anos bons). A pessoa poupa 97.09€ nos anos bons para gastar nos maus.
Se a pessoa adoptar a estratégia óptima (poupando nos anos bons para os maus) vai trabalhar mais nos anos bons. Trabalha 18.1h/sem nos anos maus e 61.9h/sem nos anos bons o que lhe permite um rendimento médio de 252.21€/sem (114.20€/s nos anos maus e 390.22€/sem nos anos bons). A pessoa trabalha mais 21.9h/sem e poupa 276.02€ nos anos bons para gastar e descansar nos maus.
É interessante observar que a oscilação da produtividade permite um rendimento médio superior ao caso em que não acontecem choques da natureza (242.74€/sem)
Podemos ver que a regularização macroeconómica vai diminuir o rendimento médio da pessoa.
Porque é que nos países pobres as pessoas produzem pouco?
Nos países pobres trabalham-se mais horas que nos países ricos pelo que a diferença na produtividade não vem do trabalho.
Fica o capital e o nível tecnológico.
O nível de capital no Bangladesh é de cerca de 450€ por pessoa e 67.5% da população é activa.
O nível de capital em Portugal é de cerca de 30000€ por pessoa e 56.0% da população é activa.
Isto traduz que em Portugal existe 53600€ de capital por posto de trabalho e no Bangladesh apenas existe 667€ por posto de trabalho.
O nível de capital associado a um emprego em Portugal é 80 vezes o nível no Bangladesh. Tal traduz que cada trabalhador português ter 1 unidade de capital enquanto que um bangladesheano ter apenas 0.0125 unidades.
Atendendo à diferença de capital, o bangladesheano produziria apenas 1.43€/h, 23% da nossa produtividade.
E o nível tecnológico no Bangladesh é inferior ao nosso (e.g., por causa da baixa escolaridade) pelo que a produtividade vem ainda mais reduzida (para 6.6% da nossa produtividade).
É por não terem capital.
Não é, como dizem os esquerdistas, por os salários serem baixos nem por o grande capital explorar os desgraçadinhos.
Não é, como dizem os direitistas, por serem malandros, pretos, azuis ou amarelos nem por serem governados por pessoas corruptas.
Não é nada disso.
A produtividade em Portugal é 15 vezes a do Bangladesh porque temos 80 vezes mais capital por trabalhador que o Bangladesh.
No Bangladesh é normal um empresário começar o seu negócio com um microcrédito de 200€ (para comprar um fogão, uma panela e um toldo para arrancar com um restaurante de rua). Em Portugal o mesmo tipo de negócio precisa de 16000€ (uma rulote).
Fig. 3 - A vida deste bangladesheano é repetir, como há milhares anos, os movimentos de uma bomba de água manual.
Como se aumenta o capital?
A falta de capital apenas pode ser resolvida (lentamente) com muito trabalho e pouco consumo (pois a poupança interna é o motor do investimento).
Apesar de capital estrangeiro (o investimento directo estrangeiro) poder ser muito positivo por levar não só capital como também difundir tecnologia, a evidência empírica indica que apenas os países que investiram principalmente com base na poupança interna é que conseguiram abandonar a pobreza (por, a prazo, o pagamento de juros, lucros e amortizações ao exterior drenar os recursos gerados).
Além disso, os estrangeiros têm um percepção do risco diferente dos nacionais (cobram juros maiores).
Finalmente as estatísticas do desemprego.
Uma taxa de desemprego de 5% da população activa traduz que o Bangladesh tem 5.0 milhões de desempregados (a população activa é de cerca de 100 milhões de pessoas). A questão é que a população empregada por conta de outrem é menos que 20 milhões de pessoas. Então, retirando da equação as pessoas auto-empregadas, temos 5 milhões de desempregados num universo de 20 milhões de pessoas. Assim medido, o desemprego será de 25% dos empregados por conta de outrem (e não dos activos).
E porque existem estes 5 milhões de desempregados?
Porque o progresso implica (ou é causado) a passagem de trabalhador por conta própria para trabalhadores por conta de outrem. Revendo a Fig. 1, o aumento de 1% do PIB pc implica que 0.25% da população deixa o emprego por conta própria e procura um emprego por conta de outrem.
Estando o Bangladesh a crescer mais de 5%/ano, todos os anos, além das pessoas que vão nascendo (2%/ano), cerca de 1.2 milhões de trabalhadores transita do auto-emprego para o mercado dos empregos por conta de outrem (6%/ano dos empregos existentes).
Naturalmente que custa a digerir a massa de pessoas que entra continuamente no mercado de empregos por conta de outrem.
Fig. 4 - Como isto está a murchar vou ter que deixar o auto-emprego e arranjar uma coisa mais fixa.
Concluindo com o exemplo do Brasil.
O primeiro passo do desenvolvimento é a agricultura libertar pessoas que passam para pequenas actividades em auto-emprego.
Depois, as pessoas em auto-emprego começam a entrar no mercado de trabalho por conta de outrem onde os salários (e a produtividade) são maiores.
O processo dinâmico de transição, apesar de ter associadas taxas de crescimento elevadas, não pode ser acompanhado pelo aumento dos salários dos diversos sectores porque o melhorar da qualidade de vida dá-se pela passagem do auto-emprego (com rendimentos muito baixos) para os empregos por conta de outrem (com salários apenas baixos).
Um país, como o Brasil, que tenha uma lei que incorpora no Salário Mínimo o crescimento do PIB está condenado a que o processo de desenvolvimento económico estagne.
Fig. 5 - Os presidentes brasileiros querem-se apresentar como chefes de estado de uma grande potência mundial esquecendo-se da pobreza que existe por toda a parte.
Eu tenho atrasada a resposta a alguns comentários.
Pedro Cosme da Costa Vieira
1 comentários:
Em que medida é que a poupança interna é o motor do investimento?
A oferta de fundos para emprestar da banca aumenta quanto maior as reservas disponíveis que têm. Essa oferta, por seu turno, vai determinar, conjuntamente com a procura de fundos, uma taxa de juro.
Se as pessoas deixarem de utilizar os seus rendimentos e os deixarem "sentados" nos bancos, então não vai haver mais empréstimos por isso. Mesmo que os utilizassem, registar-se-iam apenas movimentações contabilísticas, sendo que o bolo de depósitos à ordem ficaria igual. Com isto, o rácio reservas/Depósitos de curto prazo não se alteraria e não haveria uma expansão da oferta de fundos a emprestar e, portanto, a taxa de juro manter-se-ia igual. Aqui haveria uma espécie de "paradoxo da poupança", porque não estão a realizar-se transações nem para investimento (taxas de juro iguais) nem para consumo (dinheiro "sentado"). Na realidade, dinheiro "sentado" significaria uma diminuição da velocidade da moeda, criando pressões deflacionárias ou diminuição do produto.
Se as pessoas colocarem os seus rendimentos em depósitos de longo prazo, então os bancos já podem emprestar um pouco mais, mas nada de significativo. Com 100€ à ordem, os bancos europeus podem emprestar até 9900€; com 100€a prazo, os bancos podem emprestar 10000€ - taxa de mínima de reservas de 1% para depósitos de curto prazo e 0% para depósitos de longo prazo.
Com o sistema bancário atual, assim, não é a poupança interna que é o motor do investimento, mas o contrário, porque para haver empréstimos não tem de haver poupança, basta haver reservas no banco (em alguns países nem isso é preciso).
Assim, imagine-se, peço 10000€ para comprar uma máquina. Antes de a comprar apenas debitei o ativo em depósitos e creditei o passivo em financiamento por 10000€. Neste momento, não houve poupança nem investimento. Agora, uso os 10000€ e compro a dita máquina, creditando depósitos em 10000€, debitando ativo fixo tangível em 10000€. Neste momento, houve, investimento e, assumindo que o custo de produção da máquina foi 0, houve uma poupança da empresa que me vendeu a máquina pelo lucro não distribuído de 10000€. Agora, imagine-se que a empresa que fez a máquina afinal paga aos trabalhadores e distribui os lucros, num rendimento total de 10000€. Esse dinheiro poderá então ser usado para comprar o produto que fiz com a máquina, pelo que recebo 10000€ e tenho um resultado de 10000€ (assumindo custo marginal 0). Agora, o banco bate-me à porta a pedir o dinheiro que me emprestou de volta. Aqui, no momento em que pago os 10000€ ao banco (assumindo juros 0), é que poupei efetivamente.
Note-se que tudo o que descrevi tem sempre um certo lag temporal e que o investimento aparece antes da poupança (sem lag temporal apareciam os dois ao mesmo tempo).
Assim, uma maior poupança dá a indicação de que se está a investir mais e que estes estão a gerar retorno (aquilo que é realmente importante).
A ideia que a poupança estimula investimento só é verdade em economias com "full-reserve banking" ou economias Robinson Crusoé. Aí sim, parafraseando os livros dos Schiff, para produzir redes de pesca sem morrer de fome, tenho de acumular peixe (poupança) e depois dedicar um dia a produzir as redes (investimento), satisfazendo as minhas necessidades de consumo com o stock de peixe acumulado (poupado).
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