sexta-feira, 9 de março de 2018

A guerra do aço. Estará o Trump maluco?

Olhe que não, olhe que não. 

Nos últimos dias a administração americana, i.e., o Trump, meteu uma taxa de 25% nas importações de aço e 10% nas de alumínio.
Não vou entrar em pormenores sobre os produtos que estas taxas vão ser aplicadas (porque não sei se incide apenas sobre "chapas, perfis e varas" ou se também vai incidir sobre os metais incorporados nos produtos acabados como os automóveis).
Mesmo que a taxa se aplique aos automóveis, não terá muito impacto, serão menos de 100€ por veículo, menos de 1% do preço total.
Mas o que eu quero discutir é se estas taxas fazem algum sentido ou se o Trump não passa de um louco, populista e perigoso como é pintado pelos esquerdistas.

You are f**ing America and that makes me furious.

O Brexit é a primeira pista.
O Reino Unido vai sair da União Europeia e quer manter o regime de livre comércio com a UE.
Como dizem as meninas testemunhas de Jeová, é 1-0 contra o Trump pois, "se o RU quer manter o comércio livre é porque é bom".
Mas a União Europeia restante diz que não vai permitir, que vai cobrar taxas alfandegárias.
Mau! Quer então dizer que a UE acha mau ter livre comércio com o RU, 1-1 para o Trump.
Por um lado, a UE diz que o Trump é louco por cobrar taxas alfandegárias sobre o Aço e o Alumínio importado mas, por outro lado, quer cobrar taxas alfandegárias sobre tudo o que importar do RU!

A ameaça de retaliação é a segunda pista.
Se a UE vem dizer que vai retaliar criando taxas alfandegárias nos produtos americanos importados, sendo verdade a afirmação de que as taxas alfandegárias são más para todos, a UE vai infligir a si própria um tiro no pé.
Diria que, por agora, ficou 1-2 a favor do Trump.

Porque estão a demorar tanto as encomendas vindas da China?
Comprei umas memorias na China para o meu computador.
No OLX um fulano pediu-me 30€ por umas usadas. Na China comprei, novas, por 4,60€.
Isto foi em Novembro e estando previsto chegarem nos fins de Janeiro, só chegaram esta semana.
Dizem os blogs que é uma tentativa do UE para diminuir as compras directas na china pois não pagam taxas alfandegárias nem IVA.
Mas, então, as taxas alfandegárias são boas?
Diria que, acabou 1-3 a favor do Trump.

O livre comércio é bom mas é preciso repartir os ganhos de forma justa.
O comércio é bom para a humanidade por duas razões.

1) Escala mínima e economias de escala.
Os processos de produção têm uma escala mínima eficiente e, depois, há uma escala em que a eficiência é máxima (até onde se exploram as economias de escala).
Quando a eficiência é máxima, o custo médio de produzir cada unidade é mínimo.
Por exemplo, não é eficiente fazer uma fábrica de automóveis para produzir 10 automóveis por ano!
Sendo que, por exemplo, a escala de custo médio mínimo é produzir 1 milhão de automóveis por ano e existem 100 marcas de automóveis, um país mesmo que grande como a Alemanha (vendem-se cerca de 5 milhões de carros novos por ano) não pode produzir todos os automóveis de todas as marcas que os alemães querem comprar. Assim, vai produzir milhões de umas marcas (Mercedes, Audi, VW, ...) e comprar milhões de outras marcas (Toyota, ...).

2) Vantagens comparativas.
Há regiões que, por causa de características locais, são mais eficientes a produzir uns bens que outros bens. Então, à escala global ficaremos todos melhor se cada região se especializar a produzir os bens em que tem vantagens comparativamente às outras regiões.
Se, por exemplo, Portugal tem mais sol e calor que os países do Norte da Europa, especializa-se em turismo e esses países especializam-se noutras coisas.

Vamos a um exemplo.
Existem 3 bens  e 3 países (ou regiões). 
As diferenças locais fazem com que as capacidades de produção de cada trabalhador sejam diferentes em cada país. Os trabalhadores até podem ser iguais mas, localmente, a sua capacidade de produção é diferente (por exemplo, se vivem à beira mar podem ser mais eficientes a servir esplanadas e, se vivem no monte, a pastorear ovelhas).
Imaginemos que as produtividades são as seguintes (em unidades por pessoa):

Bem 1 Bem 2 Bem 3
País 1 15 5 5
País 2 10 10 15
País 3 5 15 10

Imaginemos ainda que os consumidores querem adquirir a mesma quantidade de cada bem e que, em cada região, existem 1000 trabalhadores/consumidores.

Se não houver comércio. 
Cada região vai aplicar
  545 trabalhadores na actividade onde é menos eficiente,
  273 onde é medianamente eficiente e
  182 onde é mais eficiente,
Parece totalmente contra a lógica mas são as actividades menos produtivas que vão ocupar a maior parte dos trabalhadores.
Cada pessoa vai receber um salário que lhe permitirá adquirir 2,75 unidades de cada um dos bens.

Se houver comércio.
Cada região vai aplicar os 1000 trabalhadores na actividade em que é mais eficiente, consumindo-se localmente 1/3 dos bens produzidos e exportando-se 2/3 para as outras regiões de onde se importam os outros bens.
Agora, cada trabalhador vai ter um rendimento que lhe permite consumir 5,00 unidades de cada um dos bens.
Cada país passará a produzir 15000 unidades de apenas um bem consumindo 5000 e exportando 10000. Também vai importar 5000 unidades de cada um dos outros bens (que não produz).

Entra aqui a flexibilidade a que o esquerdistas chamam "neo-liberalismo".
Sem comércio, 82% dos trabalhadores está em actividades onde é pouco produtivo que são denominadas  pelos esquerdistas como "sectores tradicionais".
Para aumentar a produtividade é preciso abandonar esses sectores o que, no curto prazo, é conseguido com falências, desemprego e pobreza das pessoas que vivem deles.
Mas, se esse processo de flexibilização não existir, a economia não pode progredir para o novo equilíbrio.
Vemos como os esquerdistas são contra a "destruição da agricultura, das pescas e do pequeno empresário, do despejo dos velhinhos dos centros históricos" mas essa destruição é a única forma de melhorarmos, globalmente, a nossa produtividade.

Não é a inovação que faz a economia crescer!
O Costa é um ignorante e, por isso, está continuamente a afirmar que "precisamos de inovação para crescer" quando o que precisamos é de re-estruturação da economia.
Precisamos que os sectores em que as pessoas são menos produtivas diminuam em favor dos sectores em que as pessoas são mais produtivas.
Por exemplo, a Cristas fez a "lei dos desejos dos velhotes das zonas históricas".
Tínhamos prédios inteiros nos centros do Porto e de Lisboa que não produziam qualquer riqueza, foram despejados para a periferia e substituídos por actividades relacionadas com o turismo que induziram grande desenvolvimento nos centros das cidades.
E Portugal tem crescido apenas à conta disto.
Os esquerdistas eram totalmente contra a flexibilidade do mercado dos arrendamentos mas, agora, chamam para si o mérito do crescimento do turismo e da renovação dos centros históricos.

Vamos às tarifas do Trump.
Não há qualquer dúvida que o comércio induz ganhos de produtividade e de bem estar.
O que seria de cada um de nós se tivesse que produzir todos os bens e serviços que consome!
Mas o problema está na divisão do ganho.
Se no exemplo eu fui boa pessoa e dividi o ganho igualmente pelos 3 países, normalmente, no mundo real, um país consegue sempre apropriar-se de uma fatia maior do ganho (e por isso é que existem negociações).
Podem todos melhorar mas uns melhorar mais do que outros, por exemplo:
  País 1, cada consumidor passa de 2,75 para 3,00
  País 2, cada consumidor passa de 2,75 para 5,00
  País 3, cada consumidor passa de 2,75 para 7,00

O que diz o Trump.
"Com a guerra comercial todos vamos perder mas uns, os que estão a dizer que vai ser o fim do Mundo, vão perder mais do que nós".
E, realmente, se os USA forem a País 1, o Canadá e o México o País 2 e o resto do mundo (onde se inclui a UE) o País 3, quem vai perder mais é o resto do mundo.

O que poderão fazer os países visados?
As taxas distorcem o mercado e reduzem o comércio o que, globalmente é mau.
Mas alguma coisa tem que ser feita e a solução é o que a UE quer impor ao Reino Unido: o país que tem ganhos desequilibrados tem que pagar contrapartidas ao país menos beneficiado.
Sendo que na actual situação o Trump quer reduzir o défice comercial, essas contrapartidas não precisam ser transferências financeiras como se faz na UE (ajudas ao desenvolvimento) mas podem ser sobre a Balança Comercial:
  1) Auto imposição de um limite às exportações (como já aconteceu no passado por parte do Japão)
  2) Criação de incentivos à importação de bens produzidos na América do Norte.

Concluindo.
Em termos económicos, faz todo o sentido que os Americanos se sintam prejudicados pelos países em industrialização acelerada e estes países têm que se sentar à mesa das negociações e encontrar formas de dividir os ganhos do comércio com os USA.
como, naturalmente, os países beneficiados não querem abrir mão do que têm conseguido, a única forma é impondo tarifas aos produtos importados.

Como gostas de mim e eu vivo triste, com saudades da minha mãezinha, vais ter que me compensar.

2 comentários:

Silva disse...


Caro PCV

Seria melhor que o Trump (e Juncker) não gozasse com todos nós com a sua pseudo-guerra comercial da treta e abolisse o salário mínimo nos Eua.

De qualquer maneira, os americanos estão com uma enorme diarreia há vários anos.

Entretanto, por cá, temos o fim definitivo da credibilidade do Expresso com o Louçã a fazer propaganda ao Karl Marx.

Anónimo disse...

PCV. Mais uma excelente análise, como é usual.

Só gostaria mais detalhe sobre o parágrafo em que assinala: "... e a solução é o que a UE quer impor ao Reino Unido...". E aos EUA, acrescento.

Será mesmo a UE ou será a Alemanhã (ver recentes declarações de mum Merkel, com o chapéu de madame UE e, no mesmo parágrafo, madame Germany)?.

Num bloco de Países (a UE) um deles melhor produtor dos tais bens mais caros e mais procurados (Alemanhã) poderá abusar da sua acrescida riqueza para especular agressivamente em "produtos" financeiros com o cúmplice, dependênte, BCE/BundesBank(?) ?.

E se um País (EUA, UK) estiver bem organizado e for mais produtivo em bens procurados, deve ser penalizado, pelos outros os tais que só gostam de andar ao Sol a beber cerveja (como dizia o outro)?. Ou devem esses Países estar gratos por saberem escolher (e poderem) a sua classe política?.

Não perca tempo a responder e, mais uma vez, parabéns.JS

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