segunda-feira, 29 de junho de 2015

Calma, calma, que não aconteceu nada.

A Grécia fechou os bancos e nada nos aconteceu. 
Nos últimos dias os esquerdistas bem anunciaram aos 4 ventos de que hoje Portugal iria ser vítima de um "ataque dos especuladores internacionais" que iriam fazer a Maria Luís engolir toda a sua bazófia.
Mas, como eu sempre o disse, nada aconteceu.
As taxas de juro que medem o nosso risco de curto prazo mantiveram-se praticamente inalteradas.
As obrigações de dívida pública portuguesas a 2 anos desvalorizaram 0,2%, o que é totalmente insignificante, mantendo-se a taxa de juro bem abaixo da taxa de inflação prevista para os próximos 2 anos pelo BCE (1,4%/ano).

Fig. 1 - Só à lupa é que se vê alguma coisa.

Mas a comunicação social diz que as taxas de juro estão a subir muito.
Mas é totalmente mentira.
Se a taxa de juro subiu de 0,063%/ano para 0,177%/ano é totalmente insignificante mas, em termos relativos, podemos dizer que a taxa de juro aumentou 181% mas isso é nada sobre uma taxa inicial (de ontem) que é praticamente zero. 
Seria como termos uma formiga em casa que, relativamente a ontem, triplicou de tamanha, o que, naturalmente, meteria medo a ninguém.

Fig. 2 - Afinal, nem à lupa se vê qualquer diferença entre o que se passa hoje e o que se passou nos outros dias.

E na Grécia?
Está tudo muito bem e, se estiver mal, que se aguentem que eu não quero saber.
Eles é que estão no caminho certo, no caminho do crescimento e do emprego pelo que devem continuar nele.
Na Guiné-Bissau é muito pior e ninguém se preocupa e é um povo nosso irmão.

Querem saber o que irá acontecer no dia 6 de Junho à 1h da madrugada?
O Tsipras vai fazer a campanha dele contra o acordo mas, no dia 5 de Junho à noite, o povinho grego vai votar que sim. Por isso, o Tsipras, por volta da meia noite vai dizer na televisão pública grega que os esquerdistas reabriram "Sou contra mas cumprirei a vontade democrática do povo grego".
Quando der 1h da madrugada, a Sr.a Merkel vai falar ao povo alemão para dizer "Vou pedir ao Bundestag para que inicie os procedimentos com vista à realização de um referendo a perguntar se o povo alemão aceita os termos do acordo das instituições europeias com o Estado Grego, mas eu vou fazer campanha contra esse acordo pois julgo que prejudica o povo alemão."

Fig. 3 - Vamos então ver se os gregos vão gostar quando a Sr.a Merkel aplicar aos alemães a democracia à moda do Varofáquis.

Onde pára o António Costa?
Ninguém sabe.

Fig. 4 - Parece-me que há uns anos já vi algo parecido com isto.

Pedro Cosme Vieira

domingo, 28 de junho de 2015

16 - A operação

Crime e Redenção 
Pedro Cosme Vieira
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Ver o capítulo anterior (15 - A recusa)    




16 – A operação 
Lá foram aquelas 8 mulheres pela calada da noite em direcção à casa da Maria Zé. 
– O Francisco não me vai abrir a porta. Como a Júlia esteve lá, a Maria Zé vai desconfiar e vai proibi-lo de me abrir a porta. O meu filho é muito respeitador do que diz a mulher pelo que não vai fazer nada.
– Vamos então mudar de estratégia, apanhemos um pouco de caruma para podermos fazer uma fogueira à porta de casa deles. Quando a luz da fogueira começar a entrar pelas frinchas, o Francisco vai acreditar que há um incêndio e vão sair cá fora para ver o que se passa. Também vamos bater no porco para ele grunhir, dando assim a sensação de que está em perigo. Vai cair como um patinho.
As mulheres chegaram e o cão começou logo a ladrar. Entraram no pátio em total silêncio, colocaram a caruma num monte a acenderam-na com a vela do lampião. A Júlia deu sinal a uma das filhas que foi bater com uma chibata no porco que, imediatamente, começou a grunhir. Também as ovelhas se agitaram e começaram a balir. Passado um ou dois minutos, quando a fogueira já estava alta, a mãe do Francisco bateu violentamente à porta gritando “Francisco, Francisco, estás-me a ouvir, sou a tua mãe, anda cá fora que há um incêndio na cozinha, anda cá ver, anda rápido que precisamos apagar isto para que não mate os animais e não pegue fogo à casa. Eu calhou ver o lume de minha casa e vim cá a correr mas estou sozinha, preciso que me venhas ajudar a pedir socorro senão isto arde tudo. Deve ter sido algum bandoleiro que saltou o muro e que veio meter fogo aqui. Abre a porta rápido que vais morrer ai dentro juntamente com a tua mulher e as tuas crianças. Ouve, o porco está assustado, está a adivinhar que vai morrer queimado. Anda daí meu filho.
O Francisco, ouvindo aquele burburinho, não resistiu, levantou-se da cama, calçou uns chinelos, tirou a tranca da porta, abriu-a e deu três passos em direcção à cozinha “Mãe onde está o incêndio? Mas isso é apenas uma fogueira.” Nesse mesmo momento, as mulheres que estavam encostas à parede, entraram de rompante dentro da casa, fecharam a porta e trancaram-na. “Mas que se passa? O que está a acontecer?” disse o Francisco meio atordoado.
– Xiiiuuu, anda cá meu filho, anda cá, vem para aqui, para a minha beira, para conversarmos à beira da fogueira. São as tuas tias e cunhadas que vêm resolver o problema pois a tua mulher está confusa da cabeça. Não te preocupes que tudo vai correr pelo melhor.
Entretanto, dentro da casa, como entraram em silêncio, as mulheres conseguiram prender a Maria Zé ainda na cama. Uma a segurar em cada braço e cada perna, dominaram-na completamente. As crianças ficaram assustadas mas foi ao quarto uma das tias para as sossegar. “Xiu, xiu, isto não é nada, são os serandeiros na brincadeira, vejam, trouxe-vos rebuçados e vou-vos contar a história da Fuga do Egipto”. A Isabel pôs o xaile branco pela cabeça, pegou no Levi que estava a dormir no quarto da Maria Zé e pediu ajuda à Júlia. “Júlia, vamos para a arrecadação para me ajudares a ver se a criança nasceu mesmo doente. Pela minha experiência, vejo que sim mas tu percebes mais disto.” A Júlia fez-lhe um teste demorado, avaliou se a criança conseguia agarrar as coisas, se segurava a cabeça, se tinha algum controle do tronco mas nada. “É doente, não tenho dúvida nenhuma de que nasceu doente. Mas agora o que vais fazer? É que eu não trouxe o meu saco”. A Isabel tirou uma fralda que estava em cima da mesa e disse “Mas eu resolvo o assunto, agora eu trato de tudo.” Abriu a fralda em cima da caixa da roupa, deitou em cima dela o Levi que chorava a plenos pulmões e embrulhou-a totalmente tapando-lhe a cabeça. Depois, abriu a caixa do milho e, com as mãos, afastou o cereal para um dos lados. Pegou na criança embrulhada na fralda, meteu-a naquele buraco e ainda arrumou um pouco mais para que pelo menos metade da criança ficasse já enterrada no milho. Finalmente, com a mão direita segurou a criança e, com a esquerda, puxou o monte de milho que tinha feito num dos lados da caixa para que a criança ficasse totalmente enterrada no cereal. A criança quase que se deixou de ouvir abafada pelo milho “Pronto, dentro de um minuto ela cala-se e, depois, é só esperar uma meia hora para termos a certeza de que o problema está resolvido” Assim que a criança de deixou de ouvir disse “Vamos agora falar com a Maria Zé para ver como ela está.”
A Maria Zé estava a gritar e a tentar morder as irmãs mas não conseguia por serem 4 contra uma. Quando a mãe chegou chamou por ela com voz de comando “Maria Zé, Maria Zé, sou eu, a tua mãe Isabel, pára de fazer esse teatro e ouve o que eu tenho para te dizer”.
– Mãe, Mãe o que está aqui a fazer? Quem são estas mulheres que me estão a agarrar?
– São as tuas irmãs a quem eu tive que pedir ajuda porque não abriste a porta à Tia Júlia. Eu sei que foi Deus que te toldou o pensamento para me experimentar e, por isso, viemos cá para te resolver o problema. Não te preocupes que agora está tudo bem, o Francisco está lá fora com a mãe e as crianças estão acompanhadas, não te preocupes que está tudo resolvido.
– E onde está o Levi que dormia aqui ao meu lado, onde está o meio Levi? Ainda há pouco o ouvi chorar e agora não ouço nada, onde meteram o meu filhinho?
– O teu Levi já não está entre nós, Deus chamou-o para junto dele. Como sabes, nasceu com a doença e, por causa disso, teve que ser devolvido ao Criador.
– Mas mãe, a Tia Júlia está aí? Foi ela que o matou com o defumadouro? Mas não me cheira a alecrim, o que aconteceu à minha criança, quem a matou?
– Minha filha, já te disse, o teu filho não morreu, apenas foi devolvido a Deus porque nasceu com a doença. Não foi ninguém que o matou, foi a doença, aquela maldição que nos acompanha e contra a qual não podemos mostrar fraqueza. Tens que ser forte e aceitar o teu destino. Temos todos que ser fortes e avançar para o futuro. Esta tua criança já é passado e agora tens que pensar nas que continuam vivas e aceitar as que terão que vir para substituir a que partiu. É o nosso destino e é assim que temos que viver a nossa vida.
Entretanto a Maria Zé foi-se acalmando, foi-se conformando com o seu destino e o tempo foi passando. A certa altura, a Isabel disse “Podem abrir a porta que eu preciso falar com o Francisco”. O Francisco entrou e a Isabel disse “Francisco, o Levi foi para junto do Criador. Agora, pega na tua mulher e ide passar a noite a casa da tua mãe que nós tratamos das crianças.”
– Mas que é feito do Levi? Onde está a criança?
– Já partiu para junto do Criador, não te preocupes. Como já deverias saber, a criança nasceu com a doença e, por isso, não pode continuar entre nós, veio a este mundo para condenar as tuas outras crianças à morte mas já não o vai poder fazer. Veste-te, pega na tua mulher e vai passar a noite a casa da tua mãe que veio connosco.
Soltaram as mãos e as pernas da Maria Zé que, talvez por achar que nada mais podia fazer, tomou uma posição submissa. Pegou na roupa que tinha na cadeira e vestiu-se à frente de todos. O Francisco também se vestiu e, depois, saíram os dois cá para fora. “Mãe, vamos então passar a noite a sua casa”.

“Não foi desta que me venceste” pensou a Isabel relativamente a Deus. “Eu e a Júlia ficamos aqui com as crianças e vocês já podem voltar para as vossas casas. Amanhã de manhã eu deixo as crianças a alguém aqui da vizinhança e vou tratar de tudo pois a Maria Zé não vai estar com cabeça para nada.”

Capítulo seguinte (17 - O ataque)

quarta-feira, 24 de junho de 2015

15 - A recusa

Crime e Redenção 
Pedro Cosme Vieira
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Ver o capítulo anterior (14 - A existência)    



15 – A recusa
A Maria Zé começou logo a tentar dar cumprimento ao que tinha prometido a Deus e, passado uns meses, a tentativa deu resultado: nasceu um menino que, por conselho da mãe, tomou o nome do seu irmão que tinha morrido no defumadouro, Simeão, para que nunca mais houvesse recordação dessa criança. Desta forma, o erro de Deus ficou anulado com a única diferença da criança ter ficado um anito mais nova. Dada a experiência de ter observado o desenvolvimento do Rúben, normal, e do antigo Simeão, doente, o desenvolvimento do novo Simeão foi fazendo com que a Maria Zé ganhasse confiança de que a sua criança tinha nascido livre da doença de forma que, quando, aos 4 meses, a tia Júlia apareceu para fazer o defumadouro, não houve qualquer drama. Mais tempo foi passando e nasceu a Raquel e, logo a seguir, a Sara, duas meninas cheias de saúde e de energia, nunca parando quietas. A vida estava muito difícil porque era preciso criar 4 crianças e 2 adultos com os 100€ por mês que o Francisco ganhava a trabalhar como pastor e mais algum rendimento que resultava das ovelhas e da agricultura de sobrevivência que a Maria Zé fazia no campo dentro do muro que lhe tinha sido atribuído e ao Francisco. Mas lá se iam aguentando e, afinal, já só faltava uma criança para cumprir a penitência.
Um dia de Verão nasceu mais um rapaz, o Levi, que seria o último da promessa. A Maria Zé ficou um pouco apreensiva porque a mãe tinha feito o mau presságio de que Deus, por ser brincalhão, ia voltar a atacar exactamente quando ela pensasse que já estava livre. E, realmente, aconteceu o pesadelo que lhe costumava perturbar as noites, no momento em que já via a porta de saída da prisão aberta de par em par, no último momento, quando um pé já quase estava fora, veio uma corrente de ar e a porta, muito lentamente como que levando a noite toda, fechou-se. O Levi chorava de mais e, cada dia que passava, parecia que ficava mais atrasado. O tempo foi andando até que, certo dia, aconteceu o que já estava planeado desde há anos, quando a noite já era fechada, o cão ladrou e bateram à porta “Maria Zé, sou eu, sou a Júlia, a tua tia”. A Maria Zé ainda estava a pé e o seu corpo estremeceu todo. “Ai meu Deus que ela vem para matar o meu Levi, o que é que eu posso fazer? Não lhe posso abrir a porta. Vou-me calar e manter a porta fechada”.
– Abre a porta mulher que fizeste o pacto comigo e com Deus e eu sei que estás ai porque tens a vela acesa. Abre a porta, cumpre a tua palavra, eu disse-te que o pacto era irrevogável e tu disseste perante Deus que o aceitavas. Agora não podes recuar.
A Maria Zé fez um sinal ao Francisco para que se calasse “Vai lá para o quarto que eu trato disto, a Tia Júlia quer matar-nos o Levi”. O Francisco era muito boa pessoa pelo que nem abriu a boca.
– Abre a porta mulher.
A Maria Zé aproximou-se da porta e, em voz baixa para que as crianças não acordassem, disse “Vá-se embora que eu sei que vem cá para matar o meu Levi, vá-se embora que eu amo muito o meu filho. Vá-se embora, desapareça da minha porta e nunca mais cá volte.”
Nesse momento o Francisco tomou parte na conversa, baixinho. Por ter uma fé cega e pretendendo honrar a palavra dada, ficou do lado da Tia Júlia “A tua Tia Júlia só vem cá fazer o defumadouro que nós próprios lhe encomendamos antes de nos casarmos. Não te lembras? Isso não é nada, deixa a mulher entrar que não vai resultar em nada. Temos que ter fé em Deus.”
– Cala-te que tu és um burro, não vês que ela vai matar a nossa criancinha? O Levi tem a doença, cala-te e vai-te deitar. – “Vá-se embora que eu não lhe vou abrir a porta”.
– Deixa-te disso mulher que não pode ser, fizeste o pacto, vais ter que o cumprir, custe o que custar.
– Vá-se embora, não me puxe para o inferno, vá-se embora senão saio aí fora e ainda a mato.
Por causa da discussão, o ladrar do cão foi-se tornando cada vez mais desesperado. A Tia Júlia não sabia mais o que fazer pelo que foi-se embora a falar sozinha “O filho não é meu, não sou eu que tenho que o criar, para que me vou aborrecer? Vou-me embora para a minha casinha onde estava tão bem e de onde nunca deveria ter saído” Lá foi aquele vulto escuro a caminhar no meio da escuridão total apenas iluminada por um pequeno lampião que segurava com a mão mas, pelo caminho, tendo passado pela casa da mãe da Maria Zé, a sua irmã Isabel, decidiu bater-lhe à porta para contar o sucedido.
– Isabel, Isabel, sou eu, a tua irmã Júlia, acorda que venho cá por causa da tua filha Maria Zé.
– Eu ainda estou a pé, já vou – ouviu-se de dentro da casa, um som abafado pelo ladrar do cão – já vou, aguarda só um minuto para eu destrancar a porta – e, realmente, passado um minuto, abriu-se a porta – entra, entra que a noite foi feita para as coisas que não podem andar de dia. Mas que te trás cá? Pareces aflita. Afinal qual é o problema com a minha filha?
– Venho agora de lá. Tinha combinado ir lá fazer o defumadouro ao Levi e ela não me abriu a porta pelo que, antecipo eu, já sabe que a criança nasceu com a doença. Disse mesmo que, se não me viesse embora, me matava. Eu já não tenho idade para me aborrecer com isso pelo que me vim embora.
– Mau, isso é muito mau, estou a ver que ela desistiu de lutar contra a maldição a que estamos condenados. Não, isto não pode ficar assim, nunca podemos desistir, temos que lutar sempre. Estou mesmo a ver que isto é Deus a querer brincar comigo, deu a volta à rapariga porque, quando foram os meus, viu que não me conseguia quebrar pelo que agora vai usar a minha filha para ver se eu tenho a fibra que sempre Lhe anunciei. Não pode ser, não vou quebrar agora, não, não, se dei cabo, quer dizer, resolvi o problema dos meus e eram meus, não é agora que vou deixar que a minha filha ponha tudo a perder. Não, vou eu mesma resolver isto.
– Mas o que podemos fazer?
– Eu vou resolver isto, deixa-me pensar. Como ela tem a porta trancada por dentro vou precisar de arranjar um estratagema para entrar, não vai poder ser à bruta. Já sei, vou buscar a mãe do Francisco que o vai chamar cá para fora e, depois de ele abrir a porta, eu entro.
– Mas ela é muito mais forte do que tu pelo que vai dar luta e tu precisas de liberdade de acção.
– Vou precisar de quem a agarre, já sei, vou chamar as minhas filhas que moram aqui ao lado, criei-as para alguma coisa. Vais também tu e vou ainda chamar as nossas irmãs que moram ali ao fundo da rua. Espera aqui um pouco que vou ver quem arranjo.
A Isabel lá foi apressada pela noite. Primeiro, bateu à porta das filhas que moravam mesmo ali ao lado, 3 mais os maridos e os 13 filhos, “Meninas, preparem-se que precisamos de ir a casa da vossa irmã Maria Zé que está passada da cabeça. Eu ainda preciso ir chamar a mãe do Francisco e venho já.” Depois bateu às portas das irmãs e, finalmente, à porta da mãe do Francisco que ficou muito preocupada e acedeu logo a fazer parte do ajuntamento “Já todas passamos por isso pelo que temos que nos ajudar umas às outras. O meu filho não tem estrutura para aguentar isto”. Passado uma meia hora, a Isabel já estava de volta a casa com as filhas, as irmãs e a mãe do Francisco. Com a Júlia, eram 8 mulheres.

– Meninas, vamos fazer assim, a mãe do Francisco chama o filho enquanto nós nos mantemos em silêncio. Depois, mal ele abra a porta, entramos, trancamos a porta para ele não ir em socorro da mulher e vamos todas directas ao quarto. Vocês amordaçam a Maria Zé enquanto eu retiro a criança do quarto e resolvo o problema. Amanhã de manhã, logo se vê no que deu. Estou a pensar e ainda preciso ir a casa buscar o xaile branco, eu tenho a fé que o xaile branco nos liga a Deus.

Capítulo seguinte (16 - A operação)

domingo, 21 de junho de 2015

14 - A existência

Crime e Redenção 
Pedro Cosme Vieira
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Ver o capítulo anterior (13 - O cortejo)    




14 – A existência
Como ficou combinado, certo dia o Padre Augusto voltou ao consultório do Dr. Acácio para trocar mais umas palavras sobre as mortes das crianças.
– Salve Sr. Dr., venho cá hoje para discutir outro problema que me confunde e que, no outro dia, não tive tempo para lho colocar. Como é possível que as pessoas façam um contrato para que “sejam devolvidos ao Pai do Céu” os filhos que nascerem com a doença e, depois de as darem ao mundo, resultar uma forte sensação de perda quando é executado o que tinham planeado? Pessoalmente, penso que isto não tem qualquer racionalidade, será que o Sr. Dr. vê alguma racionalidade neste sentimento de perda?
– Realmente nunca tinha pensado nisso, parece irracional porque o que nunca existiu deveria ser igual ao que existe mas que, no entretanto, deixou de existir. Mais neste caso mais é estranho porque o pais das crianças não queriam que elas chegassem sequer a nascer mas, mesmo assim, sentem a sua perda.
– Pois é exactamente isso que eu penso, a sensação de perda não é racional mas, então, porque sentem os pais essa perda? Será que as pessoas não são racionais ou será o efeito da alma da criança que, uma vez criada, nunca mais tem fim?
– Não, não, esta sensação de perda tem que ter alguma racionalidade à luz da evolução das espécies. Pode ser irracional em termos individuais mas tem que ter alguma racionalidade quando olhamos para o colectivo.
– Quer então o Sr. Dr. que isto será parecido com o Mandamento Crescei e Multiplicai-vos? Mas como pode existir uma razão na óptica do colectivo que é contrária à razão na óptica do individuo?
– Tem que ser semelhante à racionalidade da estratégia da abelha que morre ao ferrar o atacante. A abelha ao condenar-se a morrer, o que não será racional, consegue proteger o enxame.
– Sim, estou a compreender que um acto de heroísmo possa sacrificar o indivíduo para favorecer o colectivo mas não estou a ver como o desgosto poderá proteger o colectivo.
– Charles Darwin avançou a teoria que tudo o que existe hoje resulta de um longo de um longo processo de evolução e, por isso, os sentimentos que existem contribuíram no passado para que hoje estejamos vivos. A sensação de perda apenas será racional se contribuir para o aumento da capacidade de sobrevivência dos povos ao longo das gerações.
– Mas os outros animais não têm memória suficiente para conseguirem separar o que nunca existiu do que já não existe pelo que não estou a ver como esse sentimento nos pode ajudar.
– Bem, os ratos têm uma estratégia de sobrevivência totalmente diferente da nossa, enquanto que o ser humano tem poucos filhos a quem prestamos muita atenção, o rato tem 10 filhos por mês aos quais presta pouca atenção. Em todos os casos tem que ficar garantido que, geração após geração, o número de indivíduos não diminui.
– Mas esse exemplo é contrário ao que o Sr. Dr. pretende defender pois indica que os pais, desde que tivessem mais de 2 filhos saudáveis, não deveriam sentir a perda dos que morreram porque nasceram com a doença.
– Exactamente, mas o desgosto não vem da razão individual mas foi impresso na nossa mente ao longo dos milénios. Imaginemos as gerações que nos precederam ao longo dos milhares de anos e que viveram em tempos muito mais difíceis do que o actual. Se a mãe pensasse “a minha criança morrer é igual a nunca ter nascido”, à primeira dificuldade abandonava a criança à sua sorte até porque poderia sempre pensar que iria ter outra quando os tempos fossem melhores. Depois, como os tempos nunca melhoravam, o povo extinguir-se-ia. Por isso, todas as mães têm que ter um lugar especial para recordar os filhos que morreram.
– O Sr. Dr. está quase a convencer-me de que realmente esse desgosto é importante.
– É importante mas também pode ser contraproducente. Se essa recordação existe com o objectivo de melhorar a probabilidade de sobrevivência do povo, não pode passar a funcionar como um entrave a essa mesmo sobrevivência.
– Mas uma entrave como?
– Porque repetidamente há pais que usam este desgosto como argumento para não terem filhos. Argumentam que lhes causa grande desgosto ter filhos condenados a uma vida de perseguição, fome e miséria. Mas isso é errado pois seria equiparado a um rato não ter filhos para se poupar do desgosto de os ver, na grande maioria, comidos pelos gatos. No fundo, os pais têm que assumir que a sensação de perda é um sentimento que tem por fim a sobrevivência do povo e que, portanto, têm que o ultrapassar tendo mais filhos exactamente nos tempos mais difíceis. Mesmo que antecipem que os filhos vão sofrer, têm que os ver como uma obrigação que têm para com o futuro longínquo do seu povo e, quando digo longínquo, digo daqui a 10 ou 20 mil gerações, daqui a  centenas de milhar de anos.
– Sabe Sr. Dr. eu nunca tinha pensado que o nosso povo existir daqui a 10000 gerações está totalmente dependente do que a geração actual pensa quanto a ter filhos mas, realmente, se hoje não tivermos filhos por uma causa qualquer, seja a doença, a miséria ou as perseguições, o certo é nosso povo desaparecer.
– Exactamente, coloquemo-nos há apenas 120 gerações atrás, nesse tempo vivia-se a escravidão no Egipto. Hoje todos somos descendentes desses escravos. Será que algum deles antecipou que, lutando pela vida e fazendo o sacrifício de criar filhos, estava a permitir que nós hoje estivéssemos aqui?
– Não, concerteza que não, nunca o imaginaram, nem eu alguma vez imaginei isso, que tenho antepassados que fizeram parte dos escravos egípcios falados na bíblia.
– Se nos colocarmos 120 gerações atrás, temos não só antepassados que foram escravos mas também que foram reis, faraós e imperadores, que foram generais e que foram soldados, que foram conquistadores e que foram conquistados.

– Eu não imaginava essa lógica pelo que, quando recebi a inspiração de que a penitência a aplicar quando as mães matam os filhos deveria passar por mais filhos, estava mesmo a ser guiado pelo Espírito Santo. Realmente, tenho que continuar a perdoar esses defumadouros e a ajudar as mães a ultrapassar a perda que representa a morte das crianças pois é isso que, em termos de povo de Deus, faz sentido. No inicio das nossas conversas penso sempre que não vai ser possível fazer luz nas questões que me perseguem mas, no fim, saio daqui totalmente confortado. Mais uma vez, muito obrigado.

Capítulo seguinte (15 - A recusa) 

quarta-feira, 17 de junho de 2015

13 - O cortejo

Crime e Redenção 
Pedro Cosme Vieira
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Ver o capítulo anterior (12 - O foral)    


13 – O cortejo
A Maria Zé chegou a sua casa acompanhada pela mãe pouco passava das 15h quando a Sr. Celeste e a Menina Dulcinha já tinham tudo preparado. Depois de terem retirado os bancos da sala para que coubessem mais pessoas, forraram as paredes com um pano branco, fininho como gaze. Colocaram a mesa no meio da sala que usaram para pousar a urna com a criança morta. No fundo colocaram flores. Contrariamente ao que era normal, a criancinha estava na urna deitada de lado, disposição criada pela Dulcinha para dar mais visibilidade às asinhas brancas que a criança tinha nas costas e que saiam parcialmente da urna. Lá fora estava a mesa da cozinha mas, desta vez, coberta com uma toalha branca de linho que a Dulcinha tinha trazido. Estavam lá várias travessas com pataniscas de bacalhau, broa cortada em fatias e malgas para que as pessoas pudessem beber vinho ou limonada.
– Menina Dulcinha, boa tarde, isto está muito bonito, está melhor do que no funeral das minhas criancinhas, ainda era a sua falecida mãezinha a fazer os funerais. Aquilo é que era uma boa pessoa, quando chegou ao fim ainda perdava pelo menos metade do preço dos funerais, também éramos tão pobres ...
– Boa tarde Sr. Isabel, o seu netinho morreu mas eu fiz o possível para que ficasse bonito como quando estava vivo. Tenho a certeza que Deus o recebeu no Céu e fez dele um novo anjinho.
– Pois foi, agora já disse à minha filha que a única forma de esquecer esta tristeza é ter outro e andar com a vida para a frente.
No entretanto, começaram a chegar as pessoas. Vieram irmãos, cunhados, sobrinhos mas a maior parte eram primos, naquela terra parecia que todos eram primos de todos. As pessoas entravam na sala, olhavam para a criança, benziam-se e tornavam a sair para comer uma patanisca, beber um pouco de vinho e dar dois dedos de conversa. “Coitadinho mas foi a vontade de Deus” era a frase que mais se ouvia como se a morte fosse algo banal. Mas também havia quem dissesse “Custa muito ver um filho morrer mas a gente acaba por ultrapassar isso”. Depois começaram a chegar as crianças, primeiro uma, depois outra e mais outra e, passado pouco tempo, já lá estava uma pequena multidão, talvez umas 30 crianças que, seguindo as ordens do Dr. Acácio, não puderam entrar na casa “para evitar os contágios”. Eram os primos em grau diverso que tinham aparecido com o incentivo extra da limonada e dos bolinhos de mel prometidos pela Dulcinha. Além do mais, as crianças gostam do espectáculo, depois de vestidas com as capinhas brancas forradas a penas que a Dulcinha tinha, formavam com os adultos vestidos com as capas vermelhas da confraria, um contraste de grande beleza cénica.
Quando pouco faltava para as 17h, o Padre Augusto apareceu vestido com a alva, toda rendada como se fosse uma combinação de mulher, sobre a batina preta e acompanhado pelo Sr. Mariazinha vestido com a capa vermelha da confraria e que trazia a caldeirinha com a água benta, a sineta e a cruz. Assim que chegou disse “Dominus vobiscum” a que os presentes responderam “Et cum spíritu tuo”. Depois, entrou na sala, pegou na caldeirinha e, com o aspersório, espalhou água benta pela urna e espaço envolvente repetindo “Dominus animam tuam in cælum” a que as pessoas respondiam “Amen”. Depois, benzeu-se “Levantemos a urna”.
O Sr. Costa que entretanto chegou pegou na tampa, pousou-a sobre  o caixão e pregou-a. Normalmente, o caixão era reaberto no momento do enterramento mas, neste caso, já ia definitivamente pregado porque “O Sr. Dr. Acácio disse que, uma vez saído de casa, o caixão não poderia mais ser aberto”.
Se fosse um adulto, seria usada uma carroça mas, como era uma criança pequenina, seria levada por 4 pessoas numa padeola, duas a pegar à frente e duas atrás. Quando o caixão saiu, começou a formar-se a procissão fúnebre. À frente ia o Sr. Mariazinha com a sineta na mão direita, sempre a tocar, e a caldeirinha na esquerda, depois ia o Sr. Padre com a cruz que segurava com as duas mãos, logo seguido pelo caixão e, finalmente, seguina as pessoas, primeiro as crianças com a capa branca ladeadas pelos homens da capa vermelha e, depois, as mulheres e o resto dos homens que não tinham capa.
O cortejo teve que se aperta para caber pelos becos da aldeia que foi necessário percorrer até chegar à Igreja que era insuficiente para abrigar todas as pessoas pelo que a maioria ficou cá fora, no pátio que circundava o templo, meio a conversar, meio a rezar “Pela alma do anjinho”. Latinorium para aqui, latinorium para ali e tornou a sair toda a gente como se tivessem entrado por engano. O cortejo tornou-se a formar para rumar ao cemitério que ficava fora do muro que cercava a aldeia mas, agora, já só formaram as criancinhas e as pessoas que tinham a capa vermelha pois as outras foram à sua vida.
O cemitério era fora do muro que circundava a aldeia, a uns 200m metros de distância. Tinha a forma de um quadrado com 100 m de lado e era cercado por um muro alto, com 2 metros de altura que tinha apenas uma porta virada para o caminho que saia da aldeia. A procissão demorou uns 10 minutos a percorrer a distância que mediava entre a igreja e o cemitério e, quando chegou ao seu destino, o dia estava quase a terminar “Rápido, que é preciso enterrar a criança antes que o Sol se ponha” disse o Sr. Mariazinha que tinha, depois do almoço, aberto meia campa e preparado tudo para o enterramento.
“Vem ali o polícia Vieira” – disse em voz baixa a Menina Dulcinha ao Sr. Costa, seu pai. “Deixa-o vir”. O polícia não era bem querido na aldeia porque, além de não ser uma pessoa dali, gostava de inventar multas e problemas com o único fito de receber umas prendazitas. Assim que chegou à beira das pessoas começou logo a falar em voz alta.
– Parem o enterramento. Sr. Costa, é preciso que abra o caixão para eu ver o estado do cadáver que isto cheira-me a esturro.
– Boa tarde Sr. Polícia Vieira, ao menos boa-tarde, não me custava nada abri-lo mas tenho aqui o atestado do Dr. Acácio a dizer que a criança morreu de tifo e, por haver perigo para a saúde pública, o caixão não pode ser aberto. Veja aqui, veja a cópia do atestado e o original da autorização oficial para o enterramento. Esta autorização veio do seu posto da polícia, veja que está assinada pelo oficial de serviço e tem o carimbo do Sr. Arquiduque. Mas o Sr. polícia faça o favor de ir ali falar com a minha filha que foi quem tratou da papelada...
O Polícia Vieira, enquanto lia os papeis, começou a dirigir-se para a Dulcinha que estava à porta do cemitério a falar com umas pessoas.
– Menina Dulcinha, precisamos de falar em particular, venha aqui se faz favor.
– Sim Sr. Comandante, passa-se algum problema com a papelada? É que fui eu quem foi tratar disso tal e qual como aprendi com a minha mãezinha que Deus lá tem e penso que não há nenhum problema.
– Com esta gente nunca se sabe o que vai sair, são piores do que os gatos. Têm filhos atrás de filhos e, quando lhes dá na cabeça, não se acanham nada em os matar com as próprias mãos. São como os animais.
– Não diga isso Sr. Comandante que somos todos criação do mesmo Deus. Mas tenho aqui uma coisinha para o Sr. Comandante tomar um café – a Dulcinha foi ao porta-moedas e retirou uma nota de 10€ – tome lá Sr. Comandante que o Sr. também se cansou a vir cá e, como vê, os papéis estão todos em ordem.
– Isto tem aqui umas coisitas que davam para uma multa mas hoje, por estar bem disposto, vou deixar a coisa passar.
O polícia virou costas e, sem mais nada dizer, foi-se embora com cara de poucos amigos. A Dulcinha olhou de longe para o pai e fez um sinal com a mão a dizer que o enterramento poderia continuar.
Passaram duas cordas pelo caixão de forma a que fosse possível descê-lo até ao fundo da cova que tinha 7 palmos de profundidade. Assim que retiraram as cordas, o Mariazinha pegou na pá e tapou-a a toda a velocidade. Estava tudo terminado. Aquele que tinha sido deixou defenitivamente de o ser.
– Paz à sua alma.

Capítulo seguinte (14 - A existência) 

domingo, 14 de junho de 2015

12 - O foral

Crime e Redenção 
Pedro Cosme Vieira
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Ver o capítulo anterior (11 - A multiplicação)  


12 – O foral
O Sr. Padre Augusto continuou com um pouco de história.
– Quando as pessoas foram expulsas do Vale, viveram tempos terríveis. Na altura, referem os livros de registo que tenho, havia no Vale 938 pessoas do meu povo mas, por causa da matança, só conseguiram fugir para cá 492, fugiram para este monte que pertence ao Arquiduque. Como na altura não havia por aqui abrigos, no primeiro inverno morreram ainda muitas pessoas de frio e de fome de forma que só 306 pessoas chegaram à primavera seguinte. Nessa altura o Arquiduque deixou-se tocar no coração e assinou o foral que permitiu que desde então possamos a viver aqui. Foi um negócio que agradou ao Arquiduque porque viu nos refugiados uma oportunidade para valorizar estas suas propriedades que não rendiam nada. Foi bom para as pessoas porque a alternativa era entregarem-se aos turcos para serem escravos.
– O foral estou-me agora a lembrar que deve ser aquele texto em Latim que está escrito na parede da sacristia, não é? – disse o Dr. Acácio.
– Exactamente mas, como está em Latim é de difícil leitura. As negociações foram difíceis porque a única arma negocial que as pessoas tinham era a ameaça de que, em alternativa ao foral, poderiam ir para a Turquia. Depois de alguns meses de negociações, chegaram a um acordo em que as pessoas ficaram com o direito de arrotear e cultivar os terrenos do Arquiduque desde que lhe entregassem metade de tudo o que produzissem e todos os anos 10 gramas de ouro por cada pessoa válida.
– Mas isso eram condições muito desfavoráveis principalmente sabendo que era preciso arrotear os terrenos.
– Sim, eram condições desfavoráveis mas o Arquiduque, mesmo querendo, também não poderia fazer melhor pois tinha medo de ser acusado pelas pessoas do Vale de ser amigo dos que eles tentaram aniquilar. Assim, as pessoas do Vale imaginaram que, com a imposição dos 10 g por ano mais 50% sobre tudo o que produzissem, as pessoas acabaria por morrer de fome ou por se ir embora.
– Sim isso era muito pesado, 10 gramas de ouro por ano mais 50% da produção!
– Sim, eram condições duras mas o pagamento dos 10 gramas de ouro por ano além de dar à pessoa a isenção de impostos sobre cinco ovelhas e duas cabras também tinha uma cláusula que acabou por se tornar muito favorável, dizia lá que estava isento de importo tudo o que a pessoa produzisse no terreno que conseguisse cercar com um muro com uma braça de extensão.
– Bem, 5 ovelhas e duas cabras ainda vá lá que não vá, já dão algum rendimento mas um muro com uma braça não dá para cercar nada!
– Pois Dr. Acácio, realmente parece que uma braça não dá para cercar nada mas, pensaram os antigos, que era preciso garantir a todo o custo uma isenção de impostos para a manufactura. Desta forma os sapateiros, ferreiros, carpinteiros, tecedeiras ou costureiras ficariam isentos de imposto sobre os produtos que produzissem e que, depois, poderiam vender nos mercados das redondezas.
– Mas um terreno cercado por uma braça só dá para ter um banco, seria assim que as pessoas iriam trabalhar? Sentadas num banco?
– Realmente, isoladamente, uma braça só dá para um banco e deve ter sido isso que o Arquiduque pensou quando os antigos propuseram essa condição. Mas a complexidade do texto foi estratégica para deixar passar a condição de “Intra vallum, tributum vacationem” porque não proibia que as pessoas juntassem as suas braças num só muro.
– O Sr. Padre perdoe-me que eu não estou prático em Latim ...
– Sim, sim, o texto do foral diz que estão isentos de impostos todos os bens  produzidos nos terrenos cercados pelo muro e, apenas noutra condição é que diz que cada pessoa pode fazer um metro de muro. Veja só que, logo no início, com os adultos que havia nos 290 refugiados iniciais, puderam fazer um muro com 290 braças de extensão o que já dava isenção de impostos sobre terra suficiente para fazer as casas, as oficinas e ainda os currais para os animais.
– Mas o Arquiduque deve ter ficado danado quando viu o alcance dessa condição.
– Realmente, quando o procurador lhe comunicou que estavam a construir um muro que juntava as braças de toda a gente, ficou um pouco irritado mas, sendo uma pessoa séria, mandou um especialista analisar o texto do foral e, como a conclusão foi que esta interpretação estava correcta, aceitou o veredicto. Também na altura o terreno dentro do muro era pequeno, 100 m2 por pessoa.
– Mas eu penso que não deixou de ser um acaso da sorte.
– Até pode ter sido mas juntando este acaso da sorte ao crescimentos da população, a área da aldeia pode crescer até à dimensão que tem hoje. O Dr. Acácio já me fez ver que o mandamento “Crescei e multiplicai-vos” garante a sobrevivência dos povos mas, neste caso, fez com que, de ano para ano o muro fosse crescendo até hoje termos 800ha isentos de impostos. Uma condição que parecia sem importância acabou por diminuir significativamente os impostos pagos.
– E como foi que, no final, o Arquiduque aceitou o cerco dos melhores terrenos que havia no monte?
–O cercar desse terreno não causou choque porque foi acontecendo ano após ano conforme mais pessoas iam nascendo e pagando mais ouro. Veio o filho, o neto, o bisneto e só este ano o Arquiduque vai receber mais de 50kg de ouro.
– Não deixa de ser interessante como uma condição aparentemente sem importância se tornou a chave do sucesso. É interessante como já sou médico aqui há algumas dezenas de anos e só agora compreendi este pormenor do foral.
No entretanto, deu horas na torre da igreja.

– Ai meu Deus como vão as horas, Sr. Dr. agradeço-lhe muito estas palavras que me confortaram como nunca pensei ser possível. Vamos ter que continuar esta nossa conversa mas terá que ser noutro dia pois agora tenho que ir pois às 5 horas estão à espera para que eu faça o levantamento do corpo da criança falecida de casa dos pais. Até logo, até logo.

Capítulo seguinte (13 - O cortejo) 

quarta-feira, 10 de junho de 2015

11 - A multiplicação

Crime e Redenção 
Pedro Cosme Vieira
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Ver o capítulo anterior (10 - O almoço)  


11 – A multiplicação
O Padre Augusto sentia-se obrigado a dizer aos seus paroquianos que tinham que dar cumprimento ao mandamento divino “Crescei, multiplicai-vos e povoai o Mundo” mesmo que as crianças, se não morressem ainda pequeninas da doença e por causa da fome, estivessem condenadas a uma vida de trabalho penoso, perseguição e miséria. Por esse mandamento ter repetidamente resultado em tragédia, depois do almoço, contrariamente à habitual recolha para meditação, decidiu ir conversar um pouco com o Dr. Acácio sobre o que a Ciência tinha a dizer sobre o assunto. Pôs o seu chapéu preto e lá foi rua fora pelos caminhos estreitos da aldeia vestido com a batina preta que esvoaçava ao vento, absorvido pelos seus pensamentos. “A sua bênção Sr. padre” – dizia quem passava a quem o padre fazia o sinal da cruz com a mão direita e respondia “Dominus vobiscum”. Depois de uns minutos de caminhada, chegou ao consultório do Dr. Acácio, bateu à porta que estava aberta e entrou.
Salve – o Padre Augusto gostava muito de usar o latim.
– Boa tarde Sr. Padre, entre, entre que ainda estou a pensar naquela criancinha. Coitada dela e da mãe pois também deve ser terrível ver um filho tão pequeno morrer naquelas circunstâncias. Com esta idade habituei-me a estas tragédias que estão sempre a acontecer mas causa-me sempre algum desconforto. Quando era mais novo tinha relutância em passar a certidão de óbito com uma causa de morte inventada mas agora, vendo o sofrimento da mãe, deixei-me disso, além do mais, em termos médicos não havia nada que pudesse ser feito. E, no fundo, morrer por causa da fome ou do tifo não é diferente de morrer por causa dessa doença maldita, é tudo morrer. Agora que já vi tanta coisa, preocupo-me mais com a mãe e com as crianças que ficam vivas, saber se têm o que comer e, por isso tudo, mais uma vez passei a certidão de óbito a dizer que tinha sido um desarranjo intestinal, a nossa conhecida Febre Tifóide.
– Também acho que fez bem. Acaba por ser contrário ao mandamento “Não matarás” mas isso são contas a acertar um dia no futuro directamente com Deus. Eu também vim cá hoje por causa da morte daquela criança. Uma morte é sempre uma morte mas a de uma criança e por acção da própria mãe é muito mais terrível. O problema maior é que também me sinto responsável por estas mortes pois, mesmo sabendo que os filhos destes pobres estão condenados à perseguição, à miséria e ao risco da doença, estou obrigado pelas Sagradas Escrituras a transmitir-lhes uma mensagem de esperança, tenho que lhes dizer que têm que pôr o futuro nas mãos de Deus, que tudo vai correr pelo melhor e que pecam gravemente se decidirem não ter filhos. Depois, quando uma criança morre porque nasceu com a doença, não me sobra outro remédio que não seja dar a absolvição a quem a pedir e carregá-los com mais do mesmo, mais “Crescei e multiplicai-vos”.
– Sim Sr. Padre, em termos bíblicos a sua estratégia não é errada de todo, matam um mas têm que ter três ou quatro para que o saldo, na óptica das almas, seja positivo.
– Pois é essa a ideia que retiro das Sagradas Escrituras, que é melhor nascerem 4 e morrem 1 do que nascer apenas 1. Bem sei que esta moral pode cair no pensamento maquiavélico de que os fins justificam os meios mas não vejo que alternativa tenho, a criança já está morta, o que mais posso eu fazer?
– Nada.
– Pois é exactamente isso que eu penso, cum finis est licitus, etiam media sunt licitaMas o que eu quero ouvir da boca do Dr. Acácio é algo diferente, damos deixar a moral pois o quero saber é o que a Ciência tem a dizer sobre isto, sobre o mandamento “Crescei e multiplicai-vos”. Não seria melhor eu dizer às pessoas, porque são tão pobres e as crianças nascem condenadas à miséria, para não terem tantos filhos? Terem um ou dois e pronto. Ou será que se encontra na Ciência alguma lógica para este mandamento?
– Sabe, Sr. Padre, eu também já pensei muito nisso e cheguei à conclusão que sim, que à luz da Ciência este mandamento faz todo o sentido, mas não é tanto em termos individuais, dos pais e dos filhos que nascem, da miséria das suas vidas, mas em termos de dinâmica dos povos. Sabe que a decisão de nascer é sempre egoísta já que todos os pais têm a esperança de que a criança melhore as suas vidas em termos materiais ou em termos do outro mundo, pensam que dando cumprimento a esse mandamento de Deus lhes vai trazer vantagens depois da morte. Mesmo quando não têm filhos com o argumento de que não os querem expor a uma vida de miséria quase certa continuam a ser egoístas pois ter um filho a viver em condições degradantes causar-lhes-ia desconforto.
– Sim Sr. Dr., mas quem quer cumprir os mandamentos é obrigado a ter filhos, não é por sua própria vontade, sou eu que o imponho ...
– Sim e não, o que o Sr. Padre faz é, na sua fé, mostrar-lhes que, não dando cumprimento ao mandamento, ficarão condenados à perdição eterna. Sem fé na eternidade, os pais têm um filho quando o custo de criar a criança é mais que compensado pela alegria de a ver crescer e pela ajuda que receberão dele na velhice mas, com fé no mandamento, o Padre Augusto acrescenta aos pais um benefício, dá-lhes a possibilidade de, no outro mundo, serem beneficiados. Então, quem acredita que tem o dever de cumprir o mandamento, terá mais filhos porque tem um duplo benefício, o benefício terreno e o benefício divino.
– Realmente, dá-me a ideia que isso é verdade, as pessoas acabam por ter muitos mais filhos do que teriam se eu não houvesse o mandamento. Mas continuo com as minhas dúvidas, de que vale ter tantos filhos se os estão a condenar a uma vida de miséria?
– Claro que isso é verdade, mas, se não fosse assim, no passado ninguém teria tido filhos. Vamo-nos colocar no tempo em que o mandamento foi escrito, talvez há uns 5 mil anos atrás, tempo em que, além de morrer muita gente de doença e de fome, a humanidade era de uma crueldade inimaginável, as pessoas de cada povo tentavam constantemente massacrar e escravizar as pessoas dos povos vizinhos. Como nas constantes guerras de atrito a maioria dos jovens era morta ou reduzidos à escravatura, sem mandamento a vontade dos pais não seria suficiente para repor as pessoas que morriam.
 – Não tinha pensado nisso que, nos tempos antigos, o sofrimento era ainda maior do que o actual e, mesmo assim, as pessoas tiveram filhos.
– Exactamente, mas apenas tiveram filhos em número suficiente para fazer face às perdas porque lançaram mão do mandamento “Crescei e multiplicai-vos” que era a “corrida ao armamento” da antiguidade. Se um povo se reproduzisse menos que o vizinho, teria menos soldados e, mais cedo ou mais tarde, seria subjugado, condenado à escravatura e ao desaparecimento.
– Interessante esse ponto de vista da Ciência.
– Sim, sim, mas vamo-nos concentrar nesta aldeia perdida aqui no meio do Monte. Quando foi fundada tinha algumas centenas de pessoas e hoje já tem quase 10 mil habitantes.
– Sim, o Sr. Dr. deu uma volta total ao que eu pensava, um conclusão interessante e contrária ao que eu sempre pensei, eu pensava que o mandamento estava a condenar as crianças à miséria mas está a contribuir para que o povo se torne cada vez mais forte. Mas, realmente, não deixa de ser egoísmo pois estamos a obrigar a que nasçam crianças condenadas à miséria.
– Sim, é verdade, mas os povos têm que se projectar centenas de anos no futuro e não apenas para a próxima geração. Repare que se uma das gerações achar que não vale a pena ter filhos porque os tempos são difíceis, o povo fica sem futuro, desaparece da face da Terra. Se algures no passado as pessoas tivessem decidido não ter filhos para não os condenar à miséria, quantas pessoas do seu povo haveria hoje?
– Bem, naturalmente que não haveria nenhuma e eu não teria chegado a nascer. Os registos paroquiais dizem que, contando com as crianças, há 150 anos vieram para cá 290 pessoas fugidas do Vale e agora já somos quase 10 mil pessoas. Pensando nestes números tenho que concordar que cumprir o mandamento não só favoreceu a defesa como, por causa do foral, reduziu mesmo os impostos que as pessoas actualmente pagam.

– Está a ver como me começa a dar razão? Mesmo com as perseguições, os desaparecimentos e as mortandades, o seu povo conseguiu prosperar porque a maioria das pessoas manteve ao longo das gerações o comprometimento com o mandamento “Crescei e multiplicai-vos”.

Capítulo seguinte (12 - O foral)

segunda-feira, 8 de junho de 2015

A inovação tecnológia e o nível de vida

A ameaça dos robots. 
Todo o mundo é composto de mudança, tomando sempre novas qualidades (Camões) e, nas últimas décadas, a mudança tem passado pelo aparecimento de "robots" cada vez mais sofisticados.
O problema da mudança é que as pessoas são parecidas com os animais que, em jovens, procuram novos territórios mas que, em velhos, querem manter o seu reinozinho. Assim, quando somos jovens somos irreverentes, apontamos novas soluções, queremos quebrar o estado das coisas, abraçamos a mudança e a inovação mas, quando chegamos a mais velhos, tornamo-nos conservadores, queremos que o mundo se mantanha como o imaginamos há décadas atrás.
Como quem nos governa é velho, a mudança é muito dificl de acontecer.
É por isso que o padre da minha terra perdia metade do tempo da missa a anunciar o Apocalipse, que os robots iriam destruir os postos de trabalho do povinho.

O que será um robot?
No nosso imaginário vemos o robot como um humanoide dotado de capacidades sobre-humanas mas o conceito aplica-se não só a aparelhos mecânicos como virtuais.
Um "programa de computador" que percorre sites da Internet à procura de umas férias (viagem de avião + alojamento) ao menor preço também é um robot.
Um "vírus informático" que se propaga de computador em computador e que, quando "vê" uma oportunidade, ataca o sistema de um banco para tentar fazer transacções financeiras fraudulentas também é um robot.
O robot não passa de uma máquina-ferramenta. Há 10 mil anos a máquina-ferramenta que revolucionou o mundo foi o arado, desde os anos 1970 são as máquinas  "computadorizados", e nos últimos anos, são os programas de busca.

Fig. 1 - Todos nós imaginamos que um dia teremos um robot destes para nos arrumar a cozinha.

Haverá algo mais importante nas nossas vidas que os nossos robots?
Quais? Mas temos algum robot a trabalhar para nós?
Sim.
O robot que lava a nossa roupa durante a noite (e o outro que lava a louça).
O robot que optimiza a quantidade de gasolina a injectar no motor do nosso carro (e que diminui o consumo de combustível em 30%).
O robot que observa a velocidade das rodas do nosso carro não permitindo que resvalem na travagem (o ABS).
E os muitos mais pequenos robots que nos cercam e sem os quais já não poderíamos viver. Estou a pensar naquele pequeno robot que vive nos telemóveis e que se lembram dos aniversários dos contactos (eu não tenho telemóvel!).

Como era Portugal em 1960?
Nesse tempo não havia robots e a nossa agricultura era toda feita à custa da força dos humanos e dos animais.
Se perguntarem a uma pessoa com 70 anos o que pensa da década de 1960 vão ouvir que "nesse tempo havia respeito" mas não havia muito mais coisas.
Nesse tempo uma enormidade de pessoas trabalhava na agricultura mas, mesmo assim, as pessoas passavam fome. 
Na  minha terra, que não era das mais pobres de Portugal, um lavradorzeco matava um porco por ano o que correspondia a meio quilograma de carne por dia para sustentar uma casa que nunca tinha menos de 6 pessoas.
Bem sei que era "carne da verdadeira" mas era muito pouca.
Pelos meus cálculos, em 1960 o rendimento  (a preços de hoje) do trabalho de um agricultorzeco da minha terra andava nos 100€/mês, de um "jornaleiro" homem nos 75€/mês e mulher nos 50€/mês.

Fig. 2 - Emprego na agricultura em Portugal (%, dados: Rocha, 1984 e Banco Mundial)

Nos anos 1960 começaram a aparecer as máquinas agrícolas.
Em 1960, 44% das pessoas trabalhavam no sector primário (42% agricultura, 1,3% pescas e 0,6% minas), 27% na industria e outras tantas nos serviços (Rocha, 1984, quadro 8). 
No entretanto, foram sendo introduzidas máquinas na agricultura até que hoje apenas 10% das pessoas trabalham na agricultura.
Em cada 4 empregos da agricultura, apenas 1 durou até aos dias de hoje o que traduz que as máquinas agrícolas destruíram uma enormidade de emprego. Imaginando que hoje se mantinha a mesma estrutura produtiva de 1960, a introdução da maquinaria destruiu 1,3 milhões de postos de trabalho, 2 mil postos de trabalho todos os meses dos últimos 55 anos.

O que será que aconteceu a esses trabalhadores agrícolas?
Será que estão no desemprego?
Não.
De repente, os filhos dos agricultores começaram a arranjar empregos nas fábricas com salários muito superior ao rendimento que os pais retiravam da agricultura. Aos 14 anos começavam como aprendizes a ganhar 50€/mês e, quando ao vinte e poucos anos chegavam a "artistas", poderiam já ter um ordenado de 250€/mês a 300€/mês, o triplo que conseguiam os seus pais na agricultura.  
Então, os 1,3 milhões de trabalhadores potenciais ao poderem mudar de actividades menos produtivas para actividades mais produtivas, forma o motor do nosso desenvolvimento económico.

O crescimento da economia não vem de as empresas produzirem mais.
O comum dos mortais pensa que o objectivo das empresas é conseguirem produzir mais com os mesmos trabalhadores mas não é isso que acontece por causa da saturação do mercado.
Sendo certo que produzir mais com os mesmos recursos traduziria um aumento da eficiência da empresa, não é certo que a fizesse aumentar o lucro por causa da queda dos preços.
Por exemplo, de nada interessaria quadriplicar a produção agrícolas quando as pessoas comem o mesmo.
O que é certo é que a empresa melhorar o seu lucro se produzir o mesmo utilizando menos recursos.
Hoje a nossa agricultura produz sensivelmente o mesmo que produzia em 1960 (4200 milhões € a preços constantes) mas com 1/4 dos trabalhadores. 
Os trabalhadores "libertados" foram para a industria, construção civil e, posteriormente, para os serviços (e.g., o turismo) onde novos bens e serviços com maior valor passaram a ser produzidos.

Na economia agrícola.
Porque temos terrenos fracos, a menos que passássemos bastante fome, na economia agrícola nunca poderíamos ter as contas com o exterior equilibradas. 
Hoje, na economia pós agrícola, já o conseguimos fazer pois, com os excedentes dos serviços que vendemos aos estrangeiros, temos dinheiro suficiente para comprar não só os produtos agrícolas que precisamos como a energia que não produzimos (o petróleo e gás natural).
Porque as pessoas ainda têm a cabeça nos anos 1960, ainda há 4 anos atrás ninguém achava possível que viéssemos a ter contas com o exterior superavitárias como temos actualmente.

Temos que abraçar o progresso sem medo.
As máquinas e ferramentas, os robots, serão cada vez mais sofisticadas o que levará a que mais e mais pessoas sejam libertadas dos seus actuais postos de trabalho.
Claro que podemos ver isso como "destruição" de postos de trabalho mas, se queremos progresso económico, se queremos cada vez viver melhor, esse é o único caminho que existe.
Mas há e continuará a haver muitas barreiras ao progresso.
Agora vou apresentar uma inovação muito simples que permite reduzir os custos dos transportes de mercadorias a metade do preço actual sem necessidade de novas infra-estruturas.

O transporte de mercadorias.
O processo de integração económica da Europa faz com que cada vez mais bens em processo de fabrico andem a circular pelos diversos países.
Como, em média, o transporte de um semi-reboque carregado custa cerca de 1,00€/km, transportar bens entre Berlim e Lisboa (2786 km) custa cerca de 0,12€/kg.

O Tetra-Truck.
É esta a minha proposta de inovação.
Na Europa os veículos estão limitados a 18,75m de comprimento e obrigados a fazerem inversão de marcha numa rotunda com 12,5m de diâmetro. No entanto não existe nenhuma razão técnica ou económica para a existência destas limitações.
É assim apenas porque há muitos anos que o é assim.
Então, poderiam muito bem circular nas auto-estradas europeias camiões com 4 semi-reboques.

Fig. 3 - Visão lateral do Tetra-Truck

O Tetra-Truck reduziria o custo do transporte de mercadorias para metade.
Será metade porque o condutor é o mesmo, o camião, apesar de precisar ter muito mais potência (1000 Hp em comparação com os  normais 350Hp) será pouco mais caro e o consumo de combustível aumentará apenas para o dobro porque, num TIR normal, a frente do camião é responsável por 90% das perdas por atrito com o ar.
Em termos de congestionamento da infra-estrutura rodoviária, uma pista de auto-estrada consegue fazer passar 600 "cargas" /hora e, com tetra-trucks, essa capacidade duplicaria para as 1200 "cargas" /hora. 

As vias teriam que ser classificadas.
Como nas curvas os atrelados "cortam caminho", o Tetra-Truck só poderá circular em estradas largas e com curvas de grande raio. Mas isso resolve-se facilmente com a classificação das estradas em função do tamanho máximo que aguentam. Por exemplo, as estradas serão classificadas desde o E10 (capazes de suportar veículos até 10m) até ao E70 (capazes de suportar veículos até 70m).
Também, em função das subidas, as estradas teriam que ser classificada em termos de relação peso potência do camião (para que o camião circulasse pelo menos a 50km/h). Por exemplo, uma via com troços com 6% de inclinação imporia um limite máximo de 75kg/Hp que traduziria que o Tetra-Truck de 1000 Hp poderia circular com u8m peso bruto até 75 ton.

Fig.4  - Nesta via poderiam circular Tetra-Trucks de 1000 Hp com um peso bruto de 100 ton.

Haveria parques de grupagem.
Vamos supor uma empresa que vai transportar bens de uma multiplicidade de clientes nas vizinhanças de Guimarães (132 euro-palletes) para uma multiplicidade de clientes nas vizinhanças de Frankfurt am Main.
Primeiro, camiões pequenos e forgonetas transportariam as euro-palletes para um parque de estacionamento onde seriam agrupadas num Tetra-Truck.
Depois, o Tetra-Truck fazia a viagem de 2100 km de Guimarães até Frankfurt am Main.
Chegado a Frankfurt, a distribuição das euro-palettes seria feito em camiões pequenos ou furgonetas.
Até poderia acontecer o tetra-camião deixar um semi-reboque algures pelo caminho para ser atrelado a outro tetra-truck com destino a Roma.
Também o parque de grupagem poderia ser algures na cidade da Maia.
Até poderia haver empresas especializadas a fazer transportes de semi-reboques entre parques de estacionamento localizados pela europa fora.

Os Tetra-Trucks seriam bons para todos.
Diminuem o custo do transporte para metade o que fará com que bens com que os processos de fabrico pudessem ser mais partilhados em termos europeus o que melhoraria a eficiencia.
Também bens com menor valor intrínseco (por exemplo, batatas) poderiam passar a ser transportados.
Poderia haver 2 motoristas o que reduziria o tempo das viagens a metade.
As auto-estradas diminuiriam o congestionamento e aumentariam a sua rentabilidade (o valor das portagens cobradas).
Diminuiria a emissão de CO2 por tonelada transportada.

Será que alguma vezes iremos ver Tetra-Trucks nas estreadas europeias?
Penso que não.
O espaço político é formado por muitos Louçãs e companhia que dizem mal de tudo e de todos os que apresentam propostas para o aumento da eficiência das sociedades.
Dizem que isso são "os mercados" é o "grande capital" e que só interessa a quem "procura o lucro fácil" e à "especulação financeira".
Vão esses esquerdistas desmiolados atacar logo com o chavão da "destruição dos postos de trabalho", das "micro empresas" e que "temos é que investir no transporte ferroviário públicos" onde os maquinistas possam fazer greves que causem verdadeiro prejuízo à empresa (i.e., a todos nós pois se a empresa é pública ...).
Camiões não é coisa que interesse, é pequeno de mais para mentes tão inteligentes.

Por falar no Louçã, tem estado muito calado.
Os refugiados de África continuam a chegar à cadência de milhares por semana e os Franceses, os Alemães, os Espanhóis, os Italianos, um após outro, dizem que não os querem receber.
=> A minha petição <= tem pouco mais de 20 subscritores, o que acho muito estranho num país onde ninguém é racista (excepto eu).
O que será que o Louça pensa disto?
Oh pá, qual é a tua solução além de atacar o grande capital?

Fig. 5 - Se não se lhe põe a mão às boias, vai morrer afogada.

Pedro Cosme Vieira

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