sexta-feira, 18 de março de 2011

O porquê de tanta destruição em Fukushima


Quando travamos um carro a fundo ele não pára imediatamente acontecendo o mesmo com uma central nuclear.  Assim, se falhar a refrigeração, um reactor completamente desligado liquefaz-se ao fim de poucas horas. As centrais nucleares prevêm esta situação pelo que, acontecendo, é grave mas não é o fim do mundo.
A inércia
Todos sabemos que quando travamos um carro a fundo ele não pára imediatamente e que a distância de travagem é crescente com a velocidade a que vamos. À dificuldade em travar chama-se inércia do sistema. Por exemplo, um carro em piso bom e seco, a 100km/h pára em 60m e a 200km/h pára em 240m.
Uma central nuclear é como um carro a 130 000 km/h. Isto porque uma tonelada de combustível nuclear tem o poder energético de 130 000 toneladas de carvão. A densidade energética dentro do reactor nuclear é equivalente a ter 130kg de carvão em cada centímetro cúbico.
Como ao desligar o reactor nuclear não pára instantaneamente, é necessário continuar a arrefecê-lo. Num shutdown normal, a potência do reactor diminui à velocidade relativa de 3.5%/s. Por exemplo, depois de desligar um reactor com potência térmica de 3200MW, ao fim de 1 minuto, a potência reduz-se a 400MW. Em caso de emergência, a potência pode cair até 8%/s. A partir de uma potência de 7%, o decaimento fica mais lento. Por exemplo, ao fim de 15 minutos a potência é de 50MW, de 1 hora, a potência é de 35 MW e ao fim de 24h, a potência reduz-se a 15MW.
Figura 1 - Evolução da potência termica do reactor ao longo do tempo

 Como o volume do reactor é muito reduzido, estes níveis de potência ainda são muito grandes. A dilatação diferencial causada pelo calor que acontece nos diferentes matérias é suficiente para destróir o exterior do edifício da central nuclear. É como se aquecêssemos com um maçarico muito potente um copo de vidro: rachava logo o copo todo.
A altas temperaturas, acontecem ainda reacções quimicas que libertam hidrogénio (oxidação do Zircónio) o que foi o agente causador das explosões visíveis.
Será que nunca ninguém pensou nisto?
É sabido que num reactor nuclear pode acontecer uma falha total na refrigeração e que o reactor  completamente desligado, ao fim de algumas horas sem arrefecimento liquefaz-se, funde completamente.
Primeiro, funde o combustivel mas fica dentro do reactor (que é de aço). Foi o que aconteceu em Three Mile Island.
Segundo, o proprio reactor funde misturando-se com o combustivel e escorrendo para o chão da central como metal fundido.
Terceiro,  o combustivel e o reactor interagem com o betão do edificio e do chão decompondo-o e fundindo-o. O material fundido denomina-se de Corium que é uma espécie de lava.
Então, como estas situações foram estudadas, as centrais nucleares são construídas de forma a poderem resistir a esta possibilidade: o seu chão é ligeiramente enterrado, oval e feito em betão refractário (resistente ao calor) com uma espessura de 2m: é o fosso de segurança. Assim, se a central fundir completamente, fica como um alto-forno em que o material nuclear se mistura com o aço e com o betão.
No caso de o reactor fundir completamente, está previsto que seja coberto com areia refractária (alumina) podendo ser arrefecido com água.

Figura 2 - Solução técnica para uma fusão total do reactor nuclear


Um reactor nuclear fundir é muito grave mas não é o fim do mundo.
Haverá sempre fuga de muito material radioactivo para o exterior que é extremamente grave mas está prevista uma solução técnica que minimiza este problema. Perdem-se os elementos com baixo ponto de ebulição. Destes, o elemento mais grave é o Iodo 131 porque se acumula na tirode. No entanto, é um problema de curto prazo pois a sua actividade diminui rapidamente com o tempo: ao fim de 2 meses já desapareceu 99.5% da quantidade libertada.
A actividade do reactor, do corium, vai diminuindo e ao fim de umas dezenas de anos, todo o material pode ser reciclado e o local completamente descontaminado ou definitivamente sepultado (como virá a acontecer em Chernobyl).
Tenhamos esperança na capacidade e engenho da humanidade para resolver os problemas que vão surgindo associados ao progresso técnico.
E Chernobyl?
A União Soviética era um país relativamente pobre com ânsia de mostrar ao Ocidente progressos tecnologicos. Desta forma, apesar de saberem ser potencialmente mais perigoso, construiram centrais nucleares moderadas a grafite que são a solução mais barata. O perigo advém da grafite poder arder. Por outro lado, quando falhou a refrigeração, o reactor de Chernobyl estava à potência máxima e em Fukushima estava a 1.6% da potência máxima (quando a refrigeração falhou já tinham  decorridos 15 minutos desde o shutdown, fig. 1: ponto X ).
Também importante para a dimensão do acidente de Chernobyl foi o acidente ter sido tratado pelo exército que não tinha treino nem informação sobre como resolver tecnicamente o problema do incêndio da grafite.
Por fim, apesar de o reactor de Chernobyl não ter fundido completamente, as mais de 100 toneladas de grafite que existiam no seu interior incendiaram-se criando fumos radioactivos.
Figura 3 - Reactor de Chernobyl destruido vendo-se que tem fosso de segurança
O acidente de Fukushima é principalmente grave porque acontece num país que segue todas as regras de segurança mas a sua resolução também terá menos impacto negativo que Chernobyl e será útil no melhoramento das condições de seguraça de todas as centrais nucleares.

Pedro Cosme Costa Vieira

quarta-feira, 16 de março de 2011

Progresso tecnológico e a qualidade de vida – Carvão versus Nuclear

A qualidade de vida
Para podermos viver temos que consumir bens e serviços, B&S, que são produzidos com recursos naturais e trabalho. Apesar de haver quem defenda que podemos aumentar a nossa qualidade de vida fazendo meditação transcendental, o mais certo é que tal aumento obrigue a que haja maior disponibilidade de B&S. Como os recursos naturais são limitados e não aumentam ao longo do tempo, parece lógico concluir não ser possível o aumento do nível de vida.
No entanto, quem tem memória sabe que agora vivemos melhor do que viviam os nossos pais porque o trabalho é mais produtivo. Os dados históricos dos últimos 30 anos confirmam esta impressão pois mostram que a produção de cada trabalhador português, a produtividade do trabalho, tem aumentado à média de 1,67%/ano. Mas o crescimento da produtividade não cai do Céu. Comparando, por exemplo, Portugal com o Brasil (de que há o mito de que é uma economia muito dinâmica), vemos que o mais natural é a estagnação:
Produtividade (PIB por trabalhador)

Progresso tecnológico
O crescimento da produtividade acontece por haver progresso tecnológico que se materializa na invenção de modos mais eficientes de produzir os B&S existentes e a criação de novos B&S com maior valor.
Se não houvesse progresso tecnológico ainda hoje viveríamos nas cavernas. Se não tivesse sido o progresso tecnológico dos últimos 30 anos, um trabalhador que ganha actualmente 1000€/mês, veria o seu salário reduzido para 665€/mês. Infelizmente, se o crescimento da produtividade foi induzido pelo endividamento externo, então será isso que vai acontecer.
Mas o progresso tecnológico também tem um lado negativo. É como aqueles medicamentos que fazem bem às dores de cabeça mas também fazem mal ao estômago. Umas pessoas só vêem o mal que o medicamento faz ao estômago enquanto que outras só vêem o bem que faz às dores de cabeça.

A radioactividade, os computadores, a internet, os transgénicos e a clonagem.
No último século houve grandes descobertas. Uma das grandes descobertas foi a radioactividade. Descoberta em 1896 por Becquerel como um fenómeno natural, decorreram apenas 50 anos até à explosão da primeira bomba nuclear e 60 anos até ao aparecimento dos primeiros reactores nucleares para a produção de electricidade.
Não existe qualquer controvérsia no uso da tecnologia nuclear nos tratamentos contra o cancro (a radioterapia) porque não existe alternativa. Foi a criação de um B&S complemente novo.
Já na produção de electricidade, a tecnologia nuclear é uma inovação na forma de produzir um B&S previamente existente, a electricidade, tendo como alternativa a anterior tecnologia: a produção à base de carvão.
Central terrmoeléctrica a carvão tipica

Se uma central nuclear tem um investimento inicial muito elevado (cerca de 5000€ por KW de potência instalada) e custos em combustível e operação muito pequenos, uma central a carvão tem um investimento inicial bastante inferior (cerca de 2000€ por KW de potência instalada) mas um custo em combustível bastante mais elevado. Com ambas as tecnologias, o custo de produção anda próximo dos 0.03€/KWh e, por terem grande inércia, apenas podem fornecer a potência eléctrica de “Vazio”.
Em termos de efeitos colaterais, as centrais nucleares produzem resíduos radioactivos e podem ocorrer acidentes com elevado impacto negativo enquanto as centrais a carvão usam um recurso natural não renovável (o carvão) e emitem CO2 para atmosfera.
Central terrmo-nuclear-eléctrica de Quinshan
Ponderando as vantagens e as desvantagens, actualmente não existe uma resposta clara sobre qual a melhor tecnologia. Um país que não tenha em consideração a emissão de CO2 para a atmosfera e tenha pouco capital deve optar por centrais a carvão enquanto que outro que pretenda reduzir as emissões de CO2 e tenha capital para investir deve optar por centrais nucleares.

No futuro, sendo o Carvão uma tecnologia mais antiga, baseada num recurso não renovável e com elevadas emissões de CO2 para a atmosfera, é provável que a decisão penda para o lado da tecnologia nuclear.

Será o acidente de Fukushima, e a radioactividade no geral, muito perigosos?
Está claro que um nível muito elevado de radiação mata os seres vivos (frita-os como uma mosca no microondas). E em termos celulares, é sabido que destroi o DNA podendo induzir cancro. Mas é controverso o efeito de níveis baixos de radiação (até 1000x a radioactividade natural) numa população: como vamos todos morrer, os estudos têm que comparar a esperança de vida de uma população sujeita a um nível “médio” de radiação com uma população sujeita a um nível “baixo” de radiação. Comparando, por exemplo, a população de Hiroxima com a população de outras cidades japonesas, não se observam diferenças populacionais significativas.
Existem em Portugal zonas na Beira Alta (zonas de falha na região de Nelas e Mangualde) onde foram medidos níveis de radioactividade superiores aos níveis observados nas zonas de exclusão absoluta de Chernobyl, >40 curries/km2. E não parece que haja diferenças significativas na esperança de vida das populações destes concelhos em comparação com a média nacional. Também ninguém se tem preocupado muito em medir as diferenças.
É minha opinião que o medo da radioactividade libertada nos acidentes das centrais nucleares é psicológico e não tem fundamento nos dados.

Pedro Cosme Costa Vieira

domingo, 6 de março de 2011

O aumento dos preços dos alimentos e a pobreza no Mundo

Nos últimos meses o preço dos produtos agrícolas tem aumentado significativamente, tendo, nalguns casos, triplicado. Contrariamente ao que se possa supor, tal aumento tem um efeito positivo na redução da pobreza a nível mundial porque os países mais pobres produzem principalmente destes produtos.

A evolução dos preços dos produtos agrícolas
O preço dos alimentos tem aumentado significativamente ao longo dos últimos 5 anos. Por exemplo, no período 2000-2006, o preço médio do milho era de 2,50USA$/bushel (que corresponderia, ao câmbio actual, a 0,07€/kg) e do trigo era de 3,75USA$/bushel (que correspondia, ao câmbio actual, a 0,11€/kg). Desde 2006, os preços triplicaram.
No entanto, o aumento não traduz que os preços estejam caros mas antes que estavam insustentavelmente baixos. Por exemplo, actualmente um pão de trigo (papo seco, molete, trigo) de 45g apenas contém 0,01€ de trigo.
Os preços dos alimentos estavam exageradamente baixos por causa dos subsídios à produção agrícola atribuídos nos países mais desenvolvidos distorcerem o mercado mundial.
Com o aumento dos preços, os políticos (tinha que falar destes) e os comentadores televisivos começaram a dizer que a fome ia atacar os países mais pobres. Mandaram jornalista procurar a miséria mas o que observaram foi exactamente o contrário: há forte crescimento económico nos países mais pobres. Tiveram que mandar os correspondentes voltar a casa porque o que lá lhes disseram foi que os produtos agrícolas anormalmente baratos é que levaram para a pobreza milhões de camponeses dos países do terceiro mundo porque são países iminentemente agrícolas. Não deu notícia.

Será que os países pobres não produzem alimentos?
A produção agrícola depende principalmente da disponibilidade de terrenos pelo que é, em valor absoluto, aproximadamente constante em todo o Mundo: cerca de 500€/ano por pessoa (paridade de poder de compra). Quer isto dizer que, tanto em Portugal (que é um países classificado como rico) como em Moçambique (que é um país classificado como pobre), se produzem 500€/ano por habitante na agricultura. Nós importamos e os moçambicanos exportam produtos agrícolas porque nós consumimos mais por cabeça (vale a pena ser rico).
Como a produção é idêntica em termos absolutos, em termos relativos, a agricultura tem um peso muito importante nos países mais pobres (mais de 30% da riqueza produzida) e um peso negligenciável nos países mais ricos (menos de 3% da riqueza produzida).
Como todos os países precisam importar coisas que não produzem (petróleo, medicamentos, máquinas e ferramentas, automóveis, etc.), os países pobres que apenas têm produtos agrícolas para exportar, estando os seus preços artificialmente baixos por causa dos subsídios atribuídos nos países mais ricos, caíram a níveis de pobreza perigosamente aflitivos. Felizmente a crise financeira veio impossibilitar que os governos continuassem a dar avultados subsídios a actividades que devemos deixar, por questões económicas e éticas, para os países mais pobres.

Os preços como estão, estão bem porque combatem a pobreza mundial
A resolução dos problemas da pobreza mundial não passa por mandar para lá umas sacas de farinha ou os Médicos sem Fronteiras mas pelo permitir que às pessoas que lá trabalham, possam vender os seus produtos agrícolas a preços não manipulados pelos países mais ricos.
Um aumento de 100% nos preços dos produtos agrícolas induz um aumento imediato de mais de 30% no rendimento dos países mais pobres e apenas uma diminuição de 1,5% dos países mais ricos (supondo que importam 50% do que consomem). Vale bem o sacrifício se pensarmos que nos países mais pobres vivem 5000 milhões de pessoas.
E a médio prazo, a riqueza dos países mais ricos também irá aumentar porque os países mais pobres ficarão com poder de compra para importar bens e serviços de elevado valor.
 Pedro Cosme Costa Vieira

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