quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Os subsídios dos transportes públicos

Os transportes públicos.
O jfdr colocou questões muito importantes relativamente aos transportes públicos.

A densidade populacional e o tipo de transporte.
Países com alta densidade populacional e cidades compactas como o Japão ou a Holanda têm uma extensa rede de transporte ferroviário interurbano (comboio) associada a transporte ferroviário urbano (metro/eléctrico).

Mas eu contraponho países com muito maior densidade populacional e com cidades muito mais compactas como a Índia e  o Bangladesh que praticamente não têm comboios.
A variável importante é a disponibilidade das pessoas para pagar meios de transporte caros. O comboio como o conhecemos na Europa é muito caro.
E, apesar de parecer que o comboio é um meio de transporte de grande capacidade porque pode transporta 150 pessoas de cada vez, de facto não o é. Se pudesse haver uns comboios atrás dos outros como andam os autocarros nas estradas, seria verdade. mas, porque o comboio não consegue fazer ultrapassagens, mudar de direcção rapidamente e o seu percurso tem que ser controlado remotamente (as agulhas), uma estrada tem muito mais capacidade de tráfego que uma linha de comboio.

Comparemos comboios com autocarros.
Um autocarro de 13 m inter-urbano (pode atingir 130km/h) de 2 pisos tem capacidade para 80 passageiros. Em transporte urbano (pode atingir 60km/h) tem capacidade para transportar 150 pessoas de pé.
Se dedicarmos uma via de uma estrada sem cruzamentos para autocarros, podem passar 25 autocarros por minuto (a 100km/h, um afastamento entre autocarros de 50m), 1500 autocarros por hora  que transportam 120 mil passageiros por hora. Nos transportes urbanos, podem passar 20 autocarros (a 40km/h,  um afastamento de 20 m) que transportam 180 mil pessoa por hora.
Nas mesmas condições, o máximo que uma linha de comboio consegue transportar são 20 comboios com 1500 passageiros cada um, 30000 pessoas por hora.
E a estrada pode ter subidas e descidas até 6% e ter curvas apertadas enquanto a linha de comboios tem que usar túneis e pontes porque não pode ter subidas nem descidas.
Um buraco na estrada resolve-se com uma redução de velocidade do autocarro mas uma falha na linha férrea causa o descarrilamento.
Além disso, a estrada, fora das horas de ponta, pode ter outros fins (circulação de pessoas e carros).
Acrescentar uma pista dedicada a BUS numa autoestrada é muito, muito mais barato que fazer uma linha de caminho de ferro. Muito mais barato.

O autocarro é o meio de transporte mais denso que existe.
Uma autoestrada de 3 pistas consegue trasnportar mais de 300 mil pessoas por hora.

Fig. 1 - Na Índia investem em pistas e estações para autocarros

E o autocarro gasta menos energia.
Um autocarro de 80 passageiros gasta 50 litros aos 100km o que dá 0.8 litros por passageiro, 2.30kg de CO2 por 100km. Numa viagem Porto Lisboa dá 7.0kg.
CP diz no seu site que uma viagem de Alfa cheio (301 passageiros) emite 13.0kg/passageiro. É quase o dobro das emissões de um autocarro.
Mesmo um automóvel emite menos. Com 5 passageiros gasta 7 litros aos 100km, 12.0kg/passageiro na viagem Porto-Lisboa.
E depois, a CP refere que os aviões emitem 4x mais CO2 sem referir que é a uma velocidade 6x superior e que, para esta relação de velocidades, a bicicleta emite 50x menos CO2 que o Alfa e que se construíssem uma pista Porto - Lisboa dedicada a bicicletas como existe uma linha para comboios, conseguia-se sem esforço andar a 25km/h.

Não há ninguém que consiga encontrar seja o que for palpável que permita afirmar que o comboio, seja em que condições for, é um meio de transporte superior ao transporte rodoviário.


Fig. 2  - O Youngman JNP6250G é um autocarro urbano chinês de 300 passageiros
Os comboios são como a economia planificada.
A teoria demorou muitos anos a descobrir porque a economia planificada era menos eficiente que a economia de mercado, caótica.
Ainda hoje a generalidade das pessoas pensa que o comunismo, em que as pessoas partilham tudo o que têm, é muito mais eficiente que o capitalismo em que cada um quer o máximo possível para si.
Os comboios são iguais no sentido que são planificados e controlados por oposição ao transito caótico.
Mas, como um país capitalista é muito mais eficiente que um país comunista, o transporte rodoviário aparentemente caótico é muito mais eficiente que o transporte por comboio aparentemente optimizado.
A questão é que o planeador apenas consegue optimizar se se conhecer as funções objectivo das pessoas, e não se conhece.
Cai em lugares comuns como dizer que "os autocarros são menos confortáveis que os comboios" quando não se sabe o que as pessoas pensam.

O comboios deveriam acabar.
Não tenho qualquer dúvida que os comboios deveriam acabar. Desde o Metro aos comboios internacionais, de passageiros e de carga, deveria ir tudo para o inferno. Finito.
Portugal precisa transformar-se no primeiro país do mundo a acabar com os comboios. Ser progressista também é acabar com as tecnologias que se tornaram obsoletas.
Portugal deveria era construir pistas de bicicleta mas não daqueles que se resumem a uma pintura na estrada e salve-se quem puder.
Era construir de raiz pistas com viadutos, pontes e túneis optimizadas para a bicicleta que devem ser semelhantes às linhas de comboio (sem subidas). O estado deveria aplicar em cada ciclista o esforço que aplica num passageiro de uma empresa de transportes públicos.
Então, as actuais linhas de comboios seriam integradas nestas pistas.


Fig. 3 - Uma pista para bicicletas separada dos automóveis

O tempo de chek-in do avião.
O check-in do avião demora pelo menos 30 minutos e, mais a subida e a descida, vai-se uma hora. Mas não há razão operacional para que isso aconteça pois é apenas devido à ineficiencia do sistema. A Virgen tinha check-in num minuto e à porta do avião e foi proibida (porque era concorrencia).
As "questões de segurança", que não são acauteladas nos outros meios de transporte, são apenas uma desculpa. Os comboios têm sido mais vitimas de atentados que os aviões.
E, em termos tecnológicos,  já existem sistemas de check-in por reconhecimento automático da íris, da face e das impressões digitais totalmente seguros e que demoram meio minuto. 

Estarão as pessoas disponíveis a pagar o preço?
A melhor medida da pertinência de um investimento é saber a relação entre o que as pessoas estão disponíveis a pagar pelo produto e o custo de produção.
Todos os transportes públicos onde o Estado meteu a mão dão prejuízo, são altamente subsidiados e, mesmo assim, são monopólios. Isto quer dizer que, numa análise custo/benefício, as pessoas não estão disponíveis para pagar o preço de custo e que as empresas privadas podem fornecer produtos muito mais apelativos em termos de relação custo/benefício.
Se as cidades do Porto e Lisboa cobrassem o custo dos transportes e os liberalizassem, os actuais transportes públicos ficariam sem um única passageiro.
Se o TGV de qualquer parte do mundo, do Japão, à França passando pela China tivessem que pagar o custo, não tinham nem um passageiro.
Nem o maquinista lá andaria.
Zero, niente. 
E esta é que é a verdadeira medida da pertinência do TGV, dos comboios, da RTP e dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo.
A SIC e a TVI são muito superiores à RTP e não recebem aquelas centenas de milhões por ano que a gente paga na electricidade e em impostos.
Só existem porque são altamente subsidiadas.

O ordenamento do território.
Quando os transportes são caros relativamente ao custo de vida, as cidades são grandes e compactas. Por exemplo, Luanda que em 1974 tinha cerca de 300 habitantes, concentra hoje mais de 6 milhões de pessoas. Os transportes são caros porque não há estradas nem segurança.
Nos últimos 30 anos, em Portugal aconteceu o fenómeno contrário. Porque as novas estradas, a subsidiação dos transportes e a inovação tecnológica fizeram com que o preço dos transportes descesse relativamente ao rendimento, as cidades esvaziaram-se.

Acabar com a desertificação das nossas cidade é acabar com o subsídio aos transportes sub-urbanos.
Não é preciso proibir as pessoas de viver nos subúrbios mas fazer com que essas pessoas paguem os custos dessa decisão. Eu vivo a 50km do meu trabalho e há 30 anos tive que arrendar um quarto para poder estudar a essa mesma distância porque não havia SCUTS, Autoestradas ou VCI (e eu era um falido).


É terrível.
Os transportes públicos são uma das áreas mais ineficientes que existem em Portugal.
Quando eu leio os "especialistas" da minha Faculdade de Engenharia, até me doem os dentes com tamanha incompetência. Vive tudo de ter sido qualquer coisa numa empresa pública de transportes.
Porque não há terminais rodoviários em lado nenhum mas há luxuosas estações de metropolitano e de comboios?
Porque não podem as empresas privadas, mesmo sem receber subsídios, fazer transportes nas cidades?
Porque não podem os autocarros aceitar e descarregar passageiros nas estações de serviço das autoestradas?

Eu queria imaginar.
Como seria Portugal se não tivesse havido subsídios às empresas públicas de transportes.
Concerteza que teriamos um país mais concentrado nos centros das cidades antigas, mais rico, com menos impostos  e onde as pessoas teriam melhor qualidade de vida.


Fig. 4 - Eu sei que poderia estar melhor mas, quando chegar oa pipizinho, ainda vai piorar.

Pedro Cosme Costa Vieira 

6 comentários:

BC disse...

Como de costume um post brilhante no argumento e muito consistente nos dados que suportam essa argumentação.

Não faltará muito para que as duas características em que o transporte ferroviário bate o rodoviário (uso de energia eléctrica e segurança) sejam replicados nas estradas.

Mais tarde ou mais cedo aparecerão catenárias rodoviárias (wireless ou não) que permitirão a veículos híbridos percorrerem grandes distâncias movidos exclusivamente a energia eléctrica.

A segurança rodoviária demorará mais tempo a apanhar a ferroviária. E penso que a demora terá mais que ver com limitações legais do que técnicas. A forma mais eficaz de incrementar a segurança rodoviária (também aérea e ferroviária) será retirar o homem da pilotagem. mas creio que haverá muita resistência das classes profissionais (motoristas, pilotos e maquinistas) a admitir a sua obsolescência e dar lugar aos computadores.

jfdr disse...

Caro Pedro Cosme

Li este post com grande interesse e gostava de tecer dois comentários.

O porco foi domesticado em 9000 AC e a galinha em 600 AC, sendo que o kg de galinha custa menos do que o porco. Isso significa que o porco deve ser abandonado como uma fonte proteína neolítica e ineficiente?

Claro que não. Nós não comemos carne apenas para ingerir para proteínas mas também pelo prazer culinário. Assim, não tem nada de mal alguém pagar mais para comer porco do que frango, desde que tenha dinheiro para o fazer.

De acordo com http://geocurrents.info/wp-content/uploads/2013/03/meat-consumption-by-type-chart.gif em 2009 o consumo de frango per capita na Europa e na África do Sul foi o mesmo, mas o consumo de porco foi dez vezes superior na Europa.

Conclusão: O rico come o que quer, o pobre come o que pode.

Os diferentes meios de transporte (tal como os diferentes tipos de carne) são substitutos imperfeitos e há muita gente (um grupo onde me incluo) que acha que o comboio é mais confortável que a camioneta. Se houver pessoas dispostas a pagar mais para se deslocarem com mais conforto, qual é o problema?

O problema são os subsídios e a centralização, mas nem uma nem outra são intrínsecas aos caminhos-de-ferro: nos EUA o transporte de mercadorias é privado e rentável, e em Tokyo o mesmo acontece para o transporte de passageiros.

... e falar em subsídios leva inevitavelmente a pensar em externalidades: a proximidade duma estação de metro conduz a uma forte apreciação imobiliária (pelo menos em Lisboa), o que significa que os moradores do bairro têm um beneficío privado enquanto os custos são suportados por todos os contribuintes. Se calhar se estas externalidades forem tomadas em conta o metro de Lisboa já deixa de dar prejuízo (no Porto não sei). Aliás, o metro de Hong Kong consegue ter lucro porque gere os centros comerciais das estações (http://www.baconsrebellion.com/2011/08/how-to-run-a-profitable-metro-system-build-it-in-hong-kong.html). Se calhar o Colombo e o Vasco da Gama deviam pagar uma taxa...

João Pinto disse...

Artigo muito bom. Parabens.

Gostei especialmente desta parte final (não me refiro à fotografia:))

É terrível.
Os transportes públicos são uma das áreas mais ineficientes que existem em Portugal.
Quando eu leio os "especialistas" da minha Faculdade de Engenharia, até me doem os dentes com tamanha incompetência. Vive tudo de ter sido qualquer coisa numa empresa pública de transportes.
Porque não há terminais rodoviários em lado nenhum mas há luxuosas estações de metropolitano e de comboios?
Porque não podem as empresas privadas, mesmo sem receber subsídios, fazer transportes nas cidades?
Porque não podem os autocarros aceitar e descarregar passageiros nas estações de serviço das autoestradas?

Vasco Pereira disse...

O que diriam os suiços das linhas de comboio deles e os japoneses os alemães, belgas, franceses.

João Pimentel Ferreira disse...

Caro Cosme, não posso deixar de comentar perante tanta barbaridade que leio neste blogue. Que queira ser liberal, seja, também defendo o liberalismo nos transportes, mas não diga inverdades peço-lhe.

Energeticamente o comboio é muito mais eficiente que o autocarro (se quiser posso facultar-lhe dados oficiais recolhidos da CP sobre as suas motoras). Se considerar energia gasta por km-pax o comboio tem consumos muito menores, considerando ainda que é energia muito mais limpa. E não reduza impacto ambiental a emissões de CO2.

Está mais que estudado que motores a diesel são um cancro para o ambiente e para a saúde humana por causa das partículas. Também defendo a liberalização dos transportes públicos e por que não dos comboios, não foi esse o princípio quando se dividiu a CP em CP e Refer?

Mas defender o liberalismo, não significa enveredar por alternativas que não são sustentáveis (por certo sabe o que isso é quando se trata de pensões) energética e ambientalmente.
E já que fala tanto em custos peço-lhe que divulgue o www.autocustos.com

O facto de o meio ferroviário ter custos maiores para os contribuintes e consumidores, deve-se - e aí dou-lhe razão total - ao facto de historicamente ter estado sempre ligado ao estado, nunca se preocupando em ser competitivo. Basta ver que estranhamente, uma viagem de avião Lisboa-Madrid é mais barato que uma viagem de comboio Lisboa-Porto. Mas isso NÃO IMPLICA que seja mais amigo do ambiente, que seja mais seguro, nem que seja mais eficiente do ponto de vista energético.

Por isso, há muito que defendo como fazem os países do norte da Europa. Liberalizam a exploração dos transportes públicos urbanos, mas continuam sob a égide do estado.

Cumprimentos

João V disse...

Amigo... ou o simulador da CP estava mal (agora dá valores bem diferentes dos postados) ou as contas foram mal feitas.

A CP tem automotoras a gasóleo com 30 anos que gastam menos gasóleo por passageiro que um automóvel banal, para idênticas taxas de ocupação (e sabemos que o CO2 depende do consumo, não sabemos?)

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