quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023

Como se determina o preço (das armas enviadas para a Ucrânia)?

As armas são de tecnologia intensiva.

Em termos de artilharia, temos os misseis em que a propulsão resulta de um "motor de jacto" (e combustível) instalado na própria munição e as balas de canhão em que a propulsão resulta por pressão dentro de um cano que resulta de uma explosão (onde está o combustível).

Quando uma bala é disparada a 827m/s, demora cerca de 33 segundos a atingir o alvo a 25km de distância. Por causa do movimento do alvo, do vento e das irregularidades da bala, o erro é na ordem dos 100 metros, o que não é eficaz para atingir alvos de forma "cirúrgica".

O desafio dos últimos anos tem sido a criação de balas de canhão guiáveis por GPS.

O artilheiro (próximo do alvo ou usando um drone) introduz o GPS no computador e, depois, esta  informação corrige os desvios da bala durante a trajectória de forma a atingir exactamente o local pretendido. 
Mesmo durante a tragetória, o artilheiro (ou o computador) pode alterar as coordenadas (numa certa margem) para "perseguir" um alvo em movimento.

O problema das balas de canhão é a aceleração.

Para a bala ser "inteligente", tem de conter um sistema mecânico de controlo da trajectória (asas e motores) e um sistema electrónico que recebe informação e actua no sistema mecânico.

O problema é que o canhão aplica grandes acelerações à bala. Por exemplo, o canhão M777  tem um cano com 5 metros e a bala sai a 827 m/s, Mach 2.43, o que traduz que neste curto espaço, a aceleração média é 7000G (G = vezes a aceleração da gravidade).

Desenvolver sistemas resistentes a tamanha aceleração justifica que cada bala Excalibur tenha um preço de 110000€. Se for enviada uma bala por minuto, ao fim do dia foram-se 160 milhões €!!!!!!!

A guerra "inteligente" fica cara.

É 10 vezes a aceleração sentida pelo condutor de um carro que choca a 190km/h contra uma parede de betão de uma barragem (o carro e a pessoa ficam triturados).


XM982 Excalibur GPS-guided munition, 110000€ a peça.


Um tanque russo T90 tem um preço de 5 milhões€ (e um T72, 500 Mil€). Se uma bala excalibur mandar abaixo um tanque, é um bom investimento. Se atingir um navio, a pesa é ainda melhor mas para atingir moscas, é um grande prejuízo.


Mas o que quero falar é como se determina o preço.

O custo de produção não é o preço de venda por causa da forma como o custo fixo (em investigação e desenvolvimento) é dividido pelas unidades vendidas.

Vou considerar valores exemplificativos sem ter qualquer fonte sobre a realidade. Vou supor:

Desenvolver a Excalibur custou mil milhões € em custos de R&D e a empresa assumiu que, em condições normais (com as guerras no Iraque e no Afeganistão e com os stocks da ANTo), iria vender 1000 balas por ano, com um horizonte de amortização de 10 anos (um total de 10000 balas).

Acresce à amortização do custo de R&D, 10mil€ para a produção propriamente dita.

Então, a empresa teve de fixar um preço de 1000000000€/10000+10000€ = 110000€ por bala.


Mas as condições alteraram-se.

Em vez da 10000 balas pensadas, vão ser produzidas muito mais balas usando o mesmo custo de R&D. Vamos supor que, agora, a empresa planeia vender 10 vezes mais (100mil balas). Então, o preço pode descer de 100mil€ para 20mil€.

    1000000000€/100000 + 10000€ = 20000€ por bala.

Mas como já amortizou grande parte do custo de R&D, no limite, o preço pode fizar em, 10000€/bala.


O Biden diz que dá 110 mas, provavelmente, a Economia tem um custo de apenas 10.

Na contabilidade da ajuda militar anuncia 110 mil milhões € mas, como o custo de R&D já está feito, de facto, a economia americana apenas tem um custo de 10 mil milhões €.

Se ouvirmos falar apenas nos milhões que se estão a oferecer à Ucrânia para se defender, pensamos que os países ocidentais não vão aguentar muito mais tempo a guerra mas a realidade económica é muito diferente, razão porque não vemos grande impacto económico do fornecimento das armas. 

Não sendo o impacto económico tão grande como o anunciado, então, podemos aguentar a guerra na Ucrânia por tempo indefinido, uma nova guerra dos 100 anos.


Com os computadores passa-se o mesmo.

Em 1997 a Compaq lançado o computador Compaq Portable 386 por um preço de 10000€, sim, não me enganei, eram mesmo 10000€.

Esse computador tinha um processador Intel 80386 a 20 MHz, 1 MB RAM, 16 KB ROM, 1.2 MB 5¼-inch floppy, 40 or 100 MB hard disk drive e  um monitor de 10" de uma cor, âmber.

No seu interior o 386 tem 275000 transístores e executa 5MIPS.

Hoje, se alguém quisesse fazer um chip com este computador completo (um processadores 386 a 20MHz, uma memória de 1 MB e ainda um disco SSD de 100MB, node40), conseguria-o por menos de 5€. E até conseguiria velocidades muito maiores, acima de 1GHz.

E isto porquê?

Porque o custo do R&D já foi amortizado. O projecto do processador e das máquinas que fizeram o processador já estão amortizados, havendo apenas que pagar a parte variável.

Uma bolacha de 300mm node40 custa 2600€ e dá para 2600 chips de 25mm2 (onde cabem 90 milhões de transístores).


Diziam eles que este computador de 10000€ e 11kg era portable!

É esta a grande vantagem das economias capitalistas.

A minha trotinete (aparentemente low-tec) tem tecnologia que foi desenvolvida para os carros eléctricos topo de gama.

Como a aplicação da tecnologia não colide com os carros, difundiu-se pela economia permitindo o aparecimento de bens a baixo preço que, de outra forma, não poderiam existir.

Também os medicamentos, vacinas e telemóveis usados em África (e demais países sub-desenvolvidos), não pagam o custo de R&D, estando acessíveis a sociedades com nível de desenvolvimento tecnológico incompatível com os bens e serviços que consomem.


A Europa explorou África, as Américas e ainda mais.

Sim, isso é verdade, e recebeu desses territórios coisas de valor incalculável como as plantas do milho, feijão,  arroz, soja, batata, banana, etc.

Mas também fornece bens com valor muito superior ao seu preço, como sejam os computadores, automóveis, medicamentos e conhecimento científico.

É um dar e um haver histórico.

Os portugueses de hoje provavelmente não descendem dos portugueses que habitavam aqui quando chegaram os Romanos, provavelmente, nem descendem dos portugueses que habitavam aqui depois dos romanos se terem ido embora (vieram os árabes) mas temos de reconhecer que foram os romanos que introduziram a agricultura no nosso território.

Não podemos cair na histeria da "morte ao colonizador" (Portugal também é uma colónia do Império romano), ao ponto de em Cabo Verde, país desabitado aquando da descoberta, acharem que foram colonizados.

Recordo que todas as pessoas que vivem hoje em Cabo Verde, sem uma única excepção, são descendentes de colonos.

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