segunda-feira, 2 de dezembro de 2024

Porque é tão difícil acabar com o Dólar Americano como referência monetária international?

É uma questão muito difícil mas vou tentar o meu melhor, passo a passo.

É muito difícil responder a esta questão porque as pessoas confundem as variáveis nominais (os euros, dólares, meticais, reais, rublos, etc.) com as variáveis reais (batatas, arroz, ovos, horas de trabalho, etc.) porque nas economias modernas as variáveis reais estão denominadas em unidades monetárias.

Por exemplo, quando perguntam "Quanto ganhas por mês?" a pessoa diz "Ganho 987.65€/mês" quando deveria dizer "Ganho bens e serviços cuja soma dos preços é 987.65€/mês".  Ao pensar sempre em unidades monetárias, passamos a pensar o salário como um punhado de notas quando é uma quantidade de bens e serviços.


1 = O nível geral de preços e a sua estabilidade.

Vou esquecer a poupança e assumir que a pessoa esgota o salário de 987.65€/mês na compra bens e serviços, 10 kg de arroz, 2 kg de massa, 8.32 kg de frango, 8 aulas de judo, um bilhete de autocarro, uma entrada num museu, etc.  

Se pegar nos 987.65€ e dividir pela quantidade de bens (10+2+8.32+8+1+1+... = 523.25un.) vou obter o preço médio dos bens que a pessoa comprou.

      Preço médio = 987.65€ / 523.25un. = 1.888€/un.

Comprando mês após mês o mesmo cabaz de bens e serviços, o preço médio pode aumentar, manter-se ou diminuir.

INFLAÇÃO = Se o preço médio aumentar de um mês para o outro temos 

DEFLAÇÃO = Se o preço médio diminuir de um mês para o outro temos 

ESTABILIDADE DE PREÇOS = Se o preço médio se mantiver de um mês para o outro


2 = Os contratos de longo prazo e a estabilidade de preços.

Vamos supor que a pessoa tem 20 anos e faz um contrato de trabalho de longo prazo:

O trabalhador não se pode despedir nem ser despedido e recebe 987.65€/mês até fazer 70 anos.

Como o contrato está em termos nominais e não pode ser revisto, não havendo estabilidade de preços, não há forma de saber a quantidade de bens que o trabalhador vai poder comprar com o seu salário.

Mais grave ainda é se o contrato é feito com a autoridade que controla a estabilidade dos preços. Por exemplo:

Empresto 1 milhão de rublos à Rússia que se compromete a devolver-me 200 milhões de rublos daqui a 50 anos.

Com a Rússia controla a inflação em rublos, se quiser, os 200 milhões daqui a 50 anos não vão valer quase nada (o banco central russo vai fazer os preços em rublos aumentar muito).


3 = Contratos noutra moeda.

Vamos supor que vou comprar  30 mil toneladas de soja a uma empresa brasileira para entrega em 2030 no porto de Paranaguá.

Posso fazer o contrato em reais brasileiros:

30 mil toneladas de soja no porto de Paranaguá, dia 15/06/2030, a 2425 reais/tonelada.

Em alternativa posso fazer o contrato em dólares americanos:

30 mil toneladas de soja no porto de Paranaguá, dia 15/06/2030, a 400 usd/tonelada.

Qual será o contrato que tem mais risco?

Se o contrato fosse de curto prazo, isto é, a compra, o pagamento e a carga eram feitos hoje, não havia qualquer diferença em fazer o contrato em reais ou em dólares porque 2425 reais têm exactamente o mesmo poder de compra que 400 usd. O problema está nos contratos de longo prazo e, para isso, é preciso ver, nas séries históricas, a capacidade dos governos dos países manterem a estabilidade dos preços e a consequente estabilidade cambial.

Eu, enquanto vendedor, não faria o contrato em reais porque em 2019 bastavam 4 reais para ter um dólar e hoje são precisos mais do que 6 reais!

Fig. 1 = Quantidade de reais brasileiros necessários para ter um dólar americano

4 = Concorrência entre moedas pelo mercado internacional.

O povinho tem de fazer contratos na moeda local mas os agentes que operam nos mercados internacionais podem escolher a moeda dos contratos. Por exemplo, a soja de uma empresa brasileira pode ser vendida a um comprador de Hong Kong usando o metical moçambicano como moeda!

A questão está no rico cambial.

Se olharmos para a evolução histórica da taxa de inflação em dólares, tem oscilado ao longo do tempo mas com tendência abaixo de 5%/ano (ver figura seguinte). Já o metical é uma montanha russa dependente de vontades administrativa e nada garante que, de um momento para o outro, não desvalorize 90%.

Fig. 2 = Evolução da taxa de inflação americana nos últimos 90 anos

No pós-1945 foi decidido que a moeda internacional seria o dólar americano.

Mostrava estabilidade ao longo do tempo, os USA eram a economia mais forte do mundo e tinha ganho a guerra sofrendo pouca destruição. Além disso o Reino Unido, que tinha a Libra, estava muito endividado, havendo dúvida que conseguisse liderar o sistema financeiro internacional.

Foi então decidido que o FMI, uma organização internacional e não americana, teria o dólar como referência.

O FMI pertence tanto aos americanos como pertence aos portugueses.


Porque não se decidiu criar uma moeda internacional usando um cabaz de moedas?

Vamos imaginar que se criava uma moeda, o FMI, cujo valor/cotação era uma média das moedas das 10 maiores economias.

Isto foi feito na criação do Euro e, como sabemos, tem problema na governação das moedas. Como os eleitores não sabem bem como funciona a moeda (pensam que a inflação é uma coisa boa, até lhes ir ao bolso), mesmo que acreditando que os políticos percebem do assunto (não percebem), iria criar muitas tensões na governação das moedas.

O mais fácil e estável é escolher a "melhor moeda" e no pós-1945 foi decidido que essa moeda seria o dólar americano.


Há alguma vantagem para a América em o dólar ser usado como referência?

Há quem diga que sim, principalmente os esquerdistas, mas não.

É que qualquer pessoa, em qualquer parte do mundo, pode fazer um contrato denominado em dólares sem haver notas em jogo. No dia em que o contrato se cumpre, vê-se a cotação do dólar e realiza-se a transacção.

Mesmo as reservas em dólares dos bancos centrais, apesar de serem notas físicas, são emprestadas sem juros pelo FMI, não havendo qualquer lucro para o tesouro americano (havendo lucro ou prejuízo é para o FMI) 

E se um pais decidir passar a usar o dólar americano como moeda circulante, não tem de "comprar" as notas pois o FMI também as empresta sem juros (e ainda dá paga as compensações devidas à inflação).


Então, porque será que os esquerdistas do Sul querem uma nova moeda?

Porque são uma cambada de ignorantes.

Alguém acredita que o Lula sabe seja o que for de economia?


Fig. 2 = Já cheira a bacalhau, já cheira a Natal



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