quinta-feira, 23 de junho de 2011

O peso dos salários na produção é 80%

Comecei por ouvir o Carvalhas da Silva dizer que o peso dos salários na economia era pequeno, menor que 30%. E que havia empresas, por exemplo a Sonae, em que esse peso era inferior a 10% da facturação.
Num sindicalista que quer puxar a brasa à sua sardinha, aceita-se esta análise errada.

Fig. 1 - Fluxo financeiro num produtor tipico (30% trabalho)

Depois ouvi o Louçã repetir isso.
Ele é economista e deveria saber a verdade mas aceita-se num político esquerdista demagógico.
Mais estranho fiquei de ouvir este número em colegas meus.
Pensei, os gajos estão malucos. Mais uns esquerdistas, sindicalistas, demagógicos.
Nos últimos dias ouvi o Miguel Beleza, o Silva Lopes, o João Ferreira do Amaral repetir este número.
Que não valia a pena descer o custo do trabalho porque uma redução de 10% só teria um impacto de 3% nos custos totais.

Fig. 2 - Uma quebra de 10% nos custos do trabalho

Eu respeito estes economistas mas este erro é gravíssimo pelo que tenho que fazer um esclarecimento. Estimativas do Lucas colocam o peso dos salários na produção de um país entre 70% e 90%.

Fig. 3 - O grande erro da humanidade

Onde está o erro de análise?
A facturação de uma empresa inclui principalmente bens intermédios que são eles próprios produzidos com bens intermédios e trabalho. Por exemplo, com 30% de peso dos salários, contabilizando-se dois níveis de empresas que produzem bens intermédios, vemos na Fig. 4 que o peso dos salários é de 56% da facturação final, (300 + 165 + 90) /1000.
Fig. 4 - A estrutura de custos com três sectores (56% trabalho)

Nesta análise com três sectores, a diminuição em 10% dos salários já leva a uma diminuição dos custos de produção em 6%.

Fig. 5 - Uma quebra de 10% nos custos do trabalho (3 sectores)
Se estendermos a análise a mais sectores, resulta um peso do trabalho nos custos de produção de 67%.

Mas o capital também inclui trabalho
Incluindo o sector de produção de bens de capital, máquinas, fábricas, estradas, pontes, etc. que também inclui trabalho, o peso ao nível de um país vai para os tais 80%.

Uma redução dos custos do trabalho em 10%, levará a uma queda dos custos de produção em 8%.

Qual será o efeito da descida do custo do trabalho na balança comercial?
Na Alemanha, na década de 2000 houve uma redução de 15% dos custos do trabalho e, cada 1% de redução fez aumentar o superavite comercial em 0.3% do PIB.
 Fig. 6 - Relação entre a descida dos custos do trabalho e a balança comercial
Neste momento, a Alemanha vai avançar com uma redução de impostos porque têm uma balança comercial exageradamente positiva (5% do PIB alemão é um número muito grande).

E se os bens intermédios forem importados?
O meu grande amigo Paulo Sousa levantou esta questão.
É verdade que a diminuição dos custos de produção se torna menor.
Mas não é significativo por três razões:
Primeiro, as importações portuguesas de bens intermédios para usar nos bens exportados são relativamente pequenas. Não chegam a 20%.
Segundo, os concorrentes estrangeiros têm os mesmos preços que nós nas matérias-primas e nos bens intermédios importados. Por exemplo, quando o preço das pelarias (ou do gasóleo) aumenta, tal acontece em todos os países nossos concorrentes.
Terceiro, Um país acrescenta valor às suas importações que depois reexporta (por exemplo, importa peles e exporta sapatos) e, na competitividade, já é descontado o preço internacional das matérias-primas e dos bens intermédios internacionais.
Imaginemos os hipermercados.
Um vende 300€/g de bens usando 30€/g de mão-de-obra e outro precisa de 27€/g de mão-de-obra.
A diferença nos preços de venda é de apenas 1%, mas o cliente é muito sensível a estas diferenças porque tem a noção de que está em presença de margens de comercialização diferentes.
Se assim não fosse, os distribuidores teriam margens relativas enormes, o que não se observa.
O que temos que fixar é que, a nível de um país, a proporção do custo do trabalho no total produzido é muito maior que a proporção na facturação de uma empresa.

Pedro Cosme da Costa Vieira

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