domingo, 7 de junho de 2015

10 - O almoço

Crime e Redenção 
Pedro Cosme Vieira
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Ver o capítulo anterior (9 - A substituição)  


10 – O almoço
Em termos de calorias, a alimentação tinha o pão de milho como um pilar e o caldo à lavrador como outro. Depois, havia o leite e o queijo das ovelhas e das cabras, os ovos e frangos da capoeira, a carne do porco e o arenque salgado que vinham de longe em barricas de madeira e que eram compradas no Vale.
A preparação do pão de milho, a broa, era feita ao fim da tarde. Juntavam-se 30kg a farinha de milho com água a ferver e amassava-se a mistura durante uns minutos. Tendia-se a massa, lançavam-se duas mãos-cheias de sal, peneiravam-se 2 kg de farinha de centeio por cima e juntava-se o fermento que era um quilograma de massa guardada da amassadura anterior. Voltava-se a amassar tudo e, depois, faziam-se bolas com cerca de 3 kg que se deixavam 3 horas a fermentar. Finalmente, metiam-se essas bolas de massa no forno previamente aquecido com lenha que, depois de fechado hermeticamente, cozia o pão durante toda a noite. O pão de milho, mesmo não sendo um alimento completo, era barato e, nos tempos de maior aperto, é a bóia de salvação. Para o sustento de uma semana, um adulto precisava apenas de 4 kg de farinha que custavam menos de 1€ e, para uma criança, era preciso metade desse peso. O pão comia-se durante o dia sempre que a fome apertava, sem mais nada, barrado com banha de porco ou em sopas de café ou de leite e, durante as refeições, como acompanhamento do caldo à lavrador.
Para fazer o caldo metia-se uma panela ao lume meia cheia de água com um fio de azeite, uma talhada de carne de porco salgada, uma cebola cortada às rodelas e feijão demolhado de véspera. Passada meia hora, entravam na panela as batatas e as verdura colhidas momentos antes no quintal, tudo cortado ao bocadinhos. Quando já estava tudo cozido, para engrossar juntava-se uma colherada de farinha de milho. A carne, depois de cozida, era cortada em tantas fatias quantas as pessoas na mesa, nunca calhando mais de 30 g por cabeça. Normalmente a refeição acabava com um pouco de queijo mas, em alguns dias especiais, ainda havia meio arenque cozido com batatas e couves, tudo regado com um pouco de azeite e vinho azedo.
Para beber havia a água que se ia buscar à fonte e o vinho carrascão feito de uvas que se cultivavam um pouco por todas na borda dos campos.
O almoço começou como era o costume, broa com fartura e caldo à lavrador mas, como era um dia especial, acabou com um arroz à cabidela em que o frango “morreu sem ter culpa nenhuma no sucedido”. Também não faltou o vinho tinto “que aguenta mais tempo no pipo que o branco” e um refresco de limão feito com água fresca acabadinha de trazer da fonte que distava pouco mais de 100 metros da casa, mesmo encostada ao moinho.
Para sobremesa vieram uns figos secos e broa barrada com um pouco de mel de abelha. Finalmente, a refeição terminou com um chá de erva cidreira acabadinho de fazer e, para os homens, um cálice de aguardente.

Depois do almoço, foram todos continuar os seus trabalhos e a Maria Zé foi para sua casa, juntamente com a mãe, ultimar o funeral do Simeão que seria dali a apenas algumas horas.

Capítulo seguinte (11 - A multiplicação)

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